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8/02/2015

Oxi, use e morra mais rápido

Feito a base de cocaína, combustível e cal virgem, o Oxi é uma versão ainda mais corrosiva do crack. Ele é considerado por especialistas em dependência química como a versão pirata do crack.


Até agora, 1% da clientela atendida pelo Centro de Referência de Álcool, Tabaco e outras drogas (Cratod), revelou ter consumido a droga sem consciência de que não usava a pedra tradicional, feita da mistura de pasta base de coca ou cocaína refinada com água e bicarbonato de sódio.



“Os usuários que atendemos acham que fumaram o oxi pelo gosto de gasolina que sentiram na boca após consumirem o que pensavam ser crack. Eles afirmam que foram enganados”, pontua Marta Ana Joezierski, diretora do Órgão.



A especialista explica que a droga não tem apelo ao consumidor do crack. Além de mais nocivo do que o produto ‘original’ o oxi queima a garganta e deixa como resquício o gosto de combustível muito forte na boca. Os efeitos alucinógenos são exatamente os mesmos provocados pelo crack. “Não é uma substância para consumo humano, é para máquinas", assevera Marta.



O oxi contém múltiplos resíduos, é mais agressivo ao sistema respiratório, além de ser um veneno para o fígado e rins. Carlos Salgado, presidente da Associação Brasileira de Estudo sobre Álcool e Drogas (Abead) e psiquiatra da Unidade de Dependência Química do Hospital Mãe de Deus, em Porto Alegre, endossa o baixo interesse dos dependentes químicos na suposta nova droga.



“Não há diferenças no efeito, na reação que o usuário busca na droga, por isso é difícil reconhecer quem está usando. É apenas um produto mais barato, grosseiro e ainda mais agressivo. A gasolina inalada pode inutilizar rins e fígado rapidamente.”


Fim da linha


Apreensivo com a versão mais tosca do crack, Ronaldo Laranjeira, psiquiatra da Univesidade Federal de São Paulo (Unifesp) e especialista no assunto, acredita que o efeito do oxi será ainda mais devastador nos usuários antigos, chamados de forma pejorativa de “craqueiros”.



“Nenhum usuário recente buscará pelo oxi. Ele é conhecido pelas pessoas que já estão bastante debilitadas pela droga original. Na falta do crack após uma longa noite de consumo, o oxi é a alternativa mais barata, e nem sempre uma escolha.”



Para Laranjeiras, a droga fresca no mercado, mesmo que não arrebate consumidores oficiais, retroalimentará a espiral de um problema crônico de saúde pública: o ineficaz programa do governo de combate às drogas.



“Precisamos de um tratamento estruturado, regionalizado. Eu defendo a idéia de não tolerar o uso público do crack. A repressão eliminaria a cracolândia, mas é preciso oferece um serviço eficaz de assistência social ao usuário, com internação, tratamento. Todos os países que permitiram o uso público se deram muito mal.”



Dados iniciais 



Estima-se que a circulação do oxi no Brasil tenha começado em 2004, pelo norte do País. Índices isolados mostram que sua ação é ainda mais letal. Enquanto o usuário de crack vive de quatro a 15 anos, o oxi já matou 30 pessoas no Acre em apenas um ano de consumo.



“Talvez a gente tenha menos trabalho no atendimento, por que esses usuários morrerão antes de pedir ajuda”, prevê a diretora do Cratod.



Crack x Oxi



As duas drogas causam euforia, aumento da pressão arterial, elevam as chances de infarto e comprometem, a longo prazo, o sistema respiratório. O Oxi, por conter gasolina na composição, ainda é extreamente prejudicial ao fígado e rins, podendo provocar a falência de tais orgãos.



A coloração do crack é branca, enquanto o oxi pode ser encontrado nas versões amarela e roxa, conforme a concentração de gasolina e cal virgem, respectivamente.



"São drogas altamente destruidoras, principalmente por que os indivíduos fazem jornadas de uso sem hidratação ou alimentação. É uma exposição intensa e bombástica. Ficam emagrecidos, depauperados. Em muitos casos, o quadro é irreversível", alerta Carlos Salgado, presidente da Abead.

O preço da vida: R$ 10


Crack é apontado como o principal caminho entre a infância e a ameaça de morte


Quinta-feira, 17h. Faltavam só 60 minutos para a vida de Daniel acabar. A mãe não confiava mais em dar dinheiro para o filho de 15 anos que já tinha roubado a vizinhança toda e torrado tudo em droga. “Os homens” tinham prometido dar o tiro na cara. O medo maior do garoto, no entanto, era da sessão de porrada que viria antes da “bala de misericórdia”. Quem deve ao tráfico, é sabido, não tem morte rápida. E, daquela vez, Daniel não tinha a menor esperança de conseguir R$ 50 para salvar sua pele. O prazo vencia às 18h.



Por valor ainda menor, outros meninos da mesma idade de Daniel deixam a vida por causa da dependência química. A nota de R$ 10 que eles não entregam na "boca” para pagar o quanto devem por uso de crack vira o preço médio de suas vidas, segundo constatou o iGnos programas de proteção à criança ameaçada de morte em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia, Espírito Santo e Rio Grande do Sul.



Nunca ninguém contou quantos deles morreram por não darem dinheiro ao mercado paralelo de entorpecentes. Sob a forma de algarismos, estes meninos estão misturados entre os dados que fazem da violência a principal causa de morte de homens brasileiros entre 10 e 25 anos. Estão também entre os números que contam a escalada de 32% de homicídios nos últimos 15 anos. Freqüentam ainda as informações sobre déficit de vagas para tratamento clínico – e eficiente – para combater o vício nas drogas.



Daniel tinha 50 minutos para não fazer parte destes estudos numéricos do IBGE e Ministério da Saúde. A tentativa de salvamento foi acompanhada pela reportagem que assistiu ao início da ação de uma rede articulada e sigilosa no País que, diariamente, trabalha para que estes adolescentes não virem estatísticas resultantes da parceria entre drogas, saúde falha e assassinatos.



O rosto



A sigla do grupo é PPCAAM: Programa de Proteção à Criança e ao Adolescente Ameaçado de Morte. O início da atuação é o ano de 2003, em São Paulo e Belo Horizonte. O avanço da epidemia de crack – e a consequente proliferação de homicídios, como detectou pesquisa da PUC de Belo Horizonte – fez com que a Secretaria Especial de Direitos Humanos tivesse a necessidade de ampliar a rede.



Hoje, 11 capitais já têm o programa de proteção, escolhidas de acordo com os níveis altos de letalidade juvenil. A missão é acolher pessoas com menos de 18 anos e com a vida ameaçada. Além dos garotos, alguns familiares também precisam ser protegidos. Eles mudam de bairro, de escola e de rotina por pelo menos três meses. Em casos mais extremos, até a identidade é trocada. Orkut, MSN, celular são proibidos. Nada pode ser transformado em pista para seus algozes. Se um deles for morto enquanto estiver protegido, é decretado o fim do pacto de confiança selado, com muito custo, entre os agentes do PPCAAM e os meninos.



Até agora, já passaram pelas mãos do programa 1.592 crianças e adolescentes, 60% deles por causa do envolvimento com o tráfico de drogas. Quando não são os traficantes que os sentenciam à morte, são fome, falta de moradia adequada, abandono dos pais, transtornos mentais, tentativas de suicídio, testemunho de crimes e brigas de gangue que dividem o ranking de outros motivos para a proteção.



“Mas mesmo quando a droga não é o motivo principal para a proteção, os meninos e meninas sempre trazem algum relato que associa seus problemas ao uso de cocaína, crack e álcool”, afirma a coordenadora do PPCAM do Espírito Santo, Renata Freire Batista.



No mês passado, 641 jovens no País estavam tentando sair do alvo da morte violenta por meio da proteção dos PPCAAMs. Os rostos que precisam ficar escondidos têm perfil quase unânime: 76% são negros, 59% têm entre 15 e 17 anos, 95% não terminaram o ensino fundamental. Metade – apenas metade – é desligada do programa por consolidação da inserção social e cessação da ameaça.



O restante? Foge, não aceita a proteção, não consegue ficar seguro sem as drogas, não encontra uma opção de tratamento público e disponível para "já". "Ou simplesmente não entende que morrer é perigoso", conta Célia Cristina Whitalker, secretária executiva da comissão municipal de direitos humanos de São Paulo, pasta responsável pelo PPCAM paulistano.



“Eles já experimentaram a violência tantas outras vezes antes de chegar até nós que têm dificuldade para reconhecer como é uma vida sem ameaça”, conta Célia.



“São tão seduzidos pela violência, que o nosso primeiro desafio é mostrar que não há glamour em ser ameaçado.”



“Fichinha”



Naquela quinta-feira que prometia ser a última da vida de Daniel ele só tinha medo da morte porque, uma semana antes, viu de perto como ela poderia seria cruel. Seu amigo de “rolê” não havia honrado o compromisso de pagar o que devia. Levou tiros na nuca e nas costas. Morreu na hora, estirado no beco da capital paulista.



Daniel apanhou dos mesmos caras, pouco antes de assistir o menino ser alvejado. Com o olho esquerdo roxo e a voz rouca de tanto ser enforcado, ele tentava explicar a um grupo de profissionais que serve de porta de entrada do PPCAAM porque preferia o dinheiro para sanar sua dívida de R$ 50 do que ser protegido para não acabar como o colega.



“Se eu não pagar, eles vão arrombar a minha casa, matar minha mãe e meu irmão. O que vocês assistem nos programas de TV que mostram o mundo do crime é fichinha perto do que eles fazem na vida real.”



Daniel deu a primeira tragada no cigarro de maconha aos 10 anos. Não gostou do barato que deixava tudo “meio em câmera lenta”. A cocaína era mais interessante. Adrenalina pura, conseguida no banheiro da escola, com uma só cheirada.



Na primeira vez deram “a farinha” de graça. Na segunda, já cobraram. Um dia a mesada não deu mais para sustentar a droga preferida, cara demais para o bolso do adolescente. Por isso, às vezes, ele se rende ao crack. Para a boca de fumo, o garoto já levou o aparelho de som, depois os brinquedos do irmão mais novo, os CDs da mãe, o GPS do pai. Em uma dessas reviradas de gavetas na calada da noite, encontrou uma faca usada para abrir cartas. Passou a praticar furtos na vizinhança. O olhar de medo dos vizinhos começou a ser interpretado como sinal de respeito. Em segredo, a mãe até rezava para ele ser pego pela polícia.



“Juro que não sei onde errei. O meu filho menor não é assim. O Daniel tinha tudo para ser o que ele quisesse. Quem na vida sonha em ser bandido?”, questionava-se a mulher.



Cheio de marra – a penugem escura e rala sobre o lábio indica apenas o início da puberdade – Daniel exibia na mão direita um anel de ouro falso. Ele só tinha 14 anos quando se apaixonou por uma garota de 19 e colocou a aliança para mostrar compromisso. “Sou mais ou menos noivo”, disse com um sorrisinho. Pensava um dia fazer dinheiro, mudar dali e comprar um carro. Aprendeu a dirigir aos 11 anos. Adora o Orkut e a internet, onde consegue baixar os Proibidões do Funk, seu estilo de música favorito. Foi em tudo isso que ele pensou antes de se convencer que, naquele dia, não poderia voltar mais para a rotina de sempre.



A mãe estava junto com o garoto na tentativa de salvamento. E junto com os outros profissionais do programa convenceu o menino a aceitar a proteção. “Sempre soube que a minha vida iria acabar uma hora. Não quero que ninguém adiante isso”, falou o garoto para expressar que, sim, aceitava “ser protegido”.



Sem saída



O destino de Daniel era incerto, o relógio andava rápido e o grupo de funcionários precisava encontrar um local seguro para ele passar, pelo menos, uma semana. Os telefones foram disparados em busca de algum canto da cidade. Os garotos que estão no fio da navalha podem ser o fósforo que faltava em um barril de pólvora, caso encaminhados para algum local errado. Em uma das ligações, um endereço que faz parte da rede sigilosa aceitou receber o adolescente. Os ponteiros do relógio já marcavam 17h45. A mãe deu um beijo na testa dele e sugeriu “juízo”. Foi embora orientada a pagar o que o filho devia caso “os homens" aparecessem.



Apesar da história de ameaça relatada por aquela família, é preciso uma avaliação do Ministério Público, do Juizado da Vara e da Infância ou do Conselho Tutelar para algum menino ingressar de fato no PPCAAM. Daniel passaria por este processo enquanto provisoriamente deixava o bairro onde morava.



O critério de inclusão precisa ser minucioso – e rígido – pois privar alguém de liberdade para garantir a sobrevivência não pode ser regra, precisa ser exceção. “Em várias ocasiões, identifica-se que a principal questão posta é a vulnerabilidade social e não a ameaça de morte. E, por outro lado, algumas famílias optam por buscar outros meios para garantir a proteção das crianças e adolescentes (como a casa de parentes em outros municípios), visto que a inserção no programa provoca algumas mudanças”,explica Flora Luciana de Oliveira, coordenadora do PPCAAM do Rio Grande Do Sul, que começou a funcionar de maneira integrada só este ano.



A decisão de quem será ou não protegido é de revirar o estômago, mas não supera a angústia vivenciada quando o PPCAAM não existia, lembra Cláudia Tourinho, coordenadora do programa da Bahia, instalado em março deste ano. “Não tínhamos saída”, conta.



“Muitas crianças podem ter sido mortas por não chegarem até a gente. Era muito difícil conviver com estes pedidos. Hoje, um pouco de tranqüilidade é trazida com a rede. Nenhum menino que chegou até nós morreu”, comemora.



Valido muito pouco



O rótulo “ameaçado de morte” pesa. E a origem dele é confusa, explica o juiz da Vara e Infância e Juventude de Santo Amaro (na capital paulista), Iasin Issa Ahmed, que coordenou o PPCAAM de São Paulo por três anos.



“Não sabemos se é a droga que atrai a violência ou o inverso. A história de início nebuloso destes meninos tem desfecho ainda mais incerto" conta Ahmed.



“Vivemos com as mãos atadas após a proteção. Se o menino está protegido e tem uma crise de abstinência por falta da droga, é muito difícil conseguir com o governo o tratamento para ele. Não há vagas. Eles fogem e, no dia seguinte, vamos escutar um novo pedido, de uma mãe desesperada, que não suporta mais a contagem regressiva para o assassinato de um filho seu.”



Renata Batista, coordenadora do Espírito Santo, diz que qualquer garoto, de classe média, pobre ou rico, que faz uso excessivo de droga é vulnerável à ameaça. “Mas a lógica que predomina entre os que podem ou não ser exterminados é perversa. Existe ‘os matáveis’ e os ‘não matáveis’. O primeiro grupo não tem pai, mãe nem ninguém para pagar as dívidas de drogas. E a vida destes meninos tem valido muito pouco. Não é por mil ou dois mil reais. O preço é 10 reais” lamenta.



Naquele início de noite de quinta-feira, Daniel ainda não sabia de era do grupo dos matáveis ou não. O medo, nítido em sua expressão no início, agora começava a dar lugar para uma impaciência, quase incontrolável. Ele mexia as mãos e os pés sem parar. Bebeu quase dois litros de água. Já falava pouco e não olhava mais ninguém nos olhos. Indícios de que as quase 36 horas que estava sem usar cocaína estavam fazendo efeito.



Os profissionais que o acompanhavam tentavam puxar assunto e pouco conseguiam entrar na mente do garoto impaciente. Ele não sabia o que era Holanda, o que impediu a continuidade da conversa sobre os planos de morar fora do Brasil. Não conseguiu escolher uma matéria preferida da escola. Não falou de música. Até que o fio condutor do diálogo, finalmente foi encontrado: ao lado do veículo em que estava, passou um carro antigo e os olhos de Daniel brilharam. “Sempre quis um desses”, falou apontando a um Chevette. Mas o sorriso só apareceu quando falaram de super-heróis. “Sou fissurado naqueles heróis que são mutantes, sabe?”, disse o garoto.



X-men e sushimen



Quase todos os garotos que ingressam no PPCAAM sofrem mesmo da “síndrome de super-heróis”. Primeiro porque são garotos, o que torna a fantasia natural. Segundo porque enfrentam enredos que parecem existir só em filmes de ação, em que bandidos e mocinhos não têm função definida.



“São super-heróis que dão o mesmo valor para a vida e para morte”, compara Célia, a coordenadora do PPCAAM paulistano.



Às 21h, ainda vivo – mesmo após quatro horas do fim do seu prazo –, Daniel já não pensava mais no tempo enquanto falava com entusiasmo sobre o X-men. Entrou em seu "lar provisório" com o compromisso de não contar sobre a sua ameaça. Ele agora era um super-herói na imaginação.



Para a segurança do adolescente, a reportagem não pôde acompanhá-lo por mais tempo. Se é impossível saber como foi a “sexta-feira do X-men de 15 anos”, Cláudia Aguiar, coordenadora do PPCAAM de Belo Horizonte, afirma que o desafio diário de não perder a esperança de salvar estes meninos é muito compensador.



“Um dia uma de nossas funcionárias foi a um restaurante japonês e encontrou um dos meninos que já havia passado pelo PPCAAM trabalhando como sushiman, tocando a vidinha dele, feliz da vida. Foi tão recompensador... É isso que nos dá força.”



Quanto vale?



Daniel tomou banho, vestiu roupa de frio e despediu-se do grupo que, por um dia, salvou a sua vida. Antes de falar tchau, topou escrever em uma folha de caderno quais são seus sonhos. Nas seis linhas abaixo, deixou explícito que não custa caro fazer este menino feliz. Ao mesmo tempo, evidenciou que sua vida não pode valer só R$ 10.


Bilhete escrito por Daniel, 15 anos e ameaçado de morte por dívida no tráfico


A grande maioria dos municípios brasileiros – dos mais populosos aos menos habitados – já enfrenta problemas de saúde pública por causa da epidemia que se tornou o consumo de crack no Brasil. Pesquisa realizada pela Confederação Nacional de Municípios (CNM) com 3.950 municípios revela que 98% deles (3.871) precisam criar estratégias para combater o tráfico, o consumo e dar tratamento aos dependentes da droga. Eles representam 70% de todas as cidades brasileiras.


O estudo inédito tenta mostrar que as ações definidas pelo governo federal para enfrentamento da epidemia podem fracassar. Segundo o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, os municípios não possuem condições orçamentárias de financiar as ações necessárias e, sem apoio efetivo da União, ele acredita que as prefeituras não conseguirão dar conta de enfrentar o problema. “Lei é muito fácil de fazer. O Congresso Nacional é muito sábio nisso, mas não tem coragem em mexer nos cofres do governo para mostrar como aplicá-las”, diz.


O Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas anunciado pelo governo federal em maio deste ano prevê o investimento de R$ 410 milhões em diferentes ações. Desse total, R$ 120 milhões serão destinados ao Ministério da Justiça para financiar estratégias de combate ao tráfico, R$ 100 milhões para o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome para custear a reinserção social e outros R$ 90 milhões para o Ministério da Saúde, que devem ser investidos na criação de leitos para internação.


O problema, para os gestores municipais, é que não há recursos disponíveis para a maioria das cidades trabalharem no combate à droga. A criação de leitos para dependentes químicos em hospitais gerais e de Centros de Atenção Psicossociais (CAPs), que devem concentrar o atendimento aos depedentes, ainda não saíram do papel e serão restritos aos municípios com mais de 20 mil habitantes. “Mas o problema atinge as cidades menores também”, afirma o presidente da CNM.



Apenas 14,8% dos municípios pesquisados possuem um desses centros. Nos 584 centros em funcionamento no País, 5.634 profissionais atuam, sendo que, do total, 923 são médicos. Em 3.617 municípios (92% do total analisado), não há programas municipais de combate ao crack. Das 333 cidades que já possuem planos, 54% não foram aprovados ainda por leis municipais. Nessas localidades, as ações se concentram principalmente na mobilização e orientação da população e na prevenção ao uso de drogas. O atendimento a familiares e amigos de usuários ocorre em 228 municípios e o tratamento de dependentes em apenas 166.



A preocupação da confederação é com o financiamento dessas ações. Somente 82 dos programas municipais de combate recebem apoio financeiro do governo federal. A maioria (208) são custeados exclusivamente pelas prefeituras. Apesar disso, o presidente da CNM comemora o fato de que 48% das cidades pesquisadas (1.902) estão realizando algum tipo de campanha contra a epidemia. A prevenção e a orientação lidera as iniciativas.



A pesquisa



Os secretários municipais de saúde dos 3.950 ouvidos pela pesquisa responderam a 12 perguntas sobre as ações feitas para reduzir o consumo e tratar dos dependentes do crack em suas cidades. Em todos os Estados, mais de 40% dos municípios participaram do estudo. A exceção foi o Rio de Janeiro, em que apenas 16,3% dos gestores de saúde preencheram o questionário. Na região Sul, a participação dos municípios foi superior a 80%.



Ziulkoski afirma que a pesquisa deve ser estendida no futuro. No início do ano que vem, o perfil de consumo da droga nas cidades brasileiras também deve ser investigado.




Distribuição da amostra da pesquisa nos Estados

UFMunicípios por EstadoMunicípios pesquisados%
Acre221463,64
Alagoas1025858,86
Amazonas623556,45
Amapá16743,75
Bahia41726563,55
Ceará18411763,59
Espírito Santo785469,23
Goiás24618876,42
Maranhão21711553
Minas Gerais85367679,25
Mato Grosso do Sul785874,36
Mato Grosso14110373,05
Pará1437149,65
Paraíba22313962,33
Pernambuco18410858,7
Piauí22411953,13
Paraná39934085,21
Rio de Janeiro921516,3
Rio Grande do Norte1679657,49
Rondônia522853,85
Roraima15746,67
Rio Grande do Sul49643186,9
Santa Catarina29324583,62
Sergipe754661,33
São Paulo64552080,62
Tocantins1399568,35
BRASIL5.5633.95071
Fonte: Confederação Nacional dos Municípios

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