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3/02/2012

O Fundamentalismo Anônimo

 “Algumas vezes pretendemos que algumas coisas sejam verdades não porque existem indícios para isto, mas porque desejamos que sejam verdades. Confundimos a realidade com as nossas esperanças e ansiedades.” 
Carl Sagan 



O Fundamentalismo é a adoção radical de um conjunto específico de doutrinas, teológicas ou não, baseadas na aceitação de um conjunto de credos. O termo tem sido generalizado para significar a forte aderência a qualquer conjunto de dogmas em face do criticismo ou impopularidade. Assim, existe o fundamentalismo étnico, cultural, social, político entre muitos outros. Seu uso vulgar refere-se pejorativamente a qualquer grupo religioso de infringentes de uma maioria, conhecido como fundamentalismo religioso, ou a movimentos étnicos extremistas com motivações pseudo-religiosas. Fundamentalismo implica na aceitação de dogmas, verdades absolutas, que não podem ser contestadas. 

Objetiva o retorno aos princípios fundamentais que existiram ou existem nos alicerces de um determinado grupo, na maioria das vezes dissidente ou que, intencionalmente, rejeita a sua identificação com grupos maiores dos quais divergem e aos quais imputam terem se desviado da verdade e se corrompido pela adoção de princípios alternativos hostis ou contraditórios à identidade original. Por extensão de sentido, o termo "fundamentalismo" passou a ser usado por outras ciências para significar uma crença irracional e exagerada, uma posição dogmática ou até o fanatismo em relação a determinadas “verdades”. Quando adquire cunho religioso, quase sempre se refere aos muçulmanos, o que é absolutamente incorreto. 

A formação de uma identidade separada é necessária pela percepção de que a comunidade religiosa perdeu a habilidade de se definir em termos religiosos, pois julgam que os "fundamentos" da religião foram perdidos por negligência ou desatenção, configurando ato de separatismo ou divergência em termos estranhos, impróprios e hostis à própria religião. De certa maneira, isso acaba levando à proliferação de novas seitas, religiões ou novos grupos fundamentalistas, com o objetivo de manter e guardar fiel e rigidamente os princípios religiosos ditos adulterados e forçar uma aproximação interna com o mundo moderno atendendo aos referidos princípios fundamentais. 

No cristianismo, o fundamentalismo foi uma reação contra o modernismo que estava começando a se espalhar nas igrejas protestantes dos Estados Unidos, uma afirmação na inspiração divina e inerrância da Bíblia e na ressurreição e retorno de Jesus Cristo, doutrinas do evangelho consideradas fundamentais. Da mesma maneira ele está presente no catolicismo, no islamismo, no judaísmo, no hinduísmo e em várias outras religiões. Todas argumentam que o fundamentalismo fornece significado para os fundamentalistas, dando-lhes uma visão unificadora, um sentido de coerência, objetivos claros, valores absolutos e um sentido para a vida. 

Com o fundamentalismo cristão começam a aparecer movimentos doutrinários que rapidamente se espalharam pelo mundo. Assim, várias irmandades percebem o espaço para ampliar sua influência e arrebanhar mais e mais seguidores que, cegos pela fé, são ao mesmo tempo sujeitos e objetos do crescimento doutrinário que abraçaram. 

Foi assim, por exemplo, que a Klu Klux Klan, que já existia desde a guerra civil americana viu no fundamentalismo religioso emergente as ferramentas necessárias para ampliar seu poder. A KKK oferecia ao povo desorientado respostas simples para problemas complexos. Articulava a sociedade conservadora para que saíssem da apatia para uma ação organizada, contando com o apoio tácito de governos locais e estaduais e o anonimato garantido pelas vestes que os encobriam. No entanto, a grande plataforma na ascensão de KKK era o cristianismo fundamentalista protestante. Num primeiro momento a KKK tinha por objetivo restabelecer os valores cristãos protestantes na América por todos os meios possíveis pregando que Jesus foi o primeiro Klansman. Suas Cruzes queimadas serviam como intimidação aos que perseguiam e para demonstrar seu respeito e reverência para com Jesus Cristo. O ritual de iluminação foi mergulhado no simbolismo cristão, incluindo orações e hinos cristãos. 

As relações iniciais entre o nazismo e o cristianismo podem ser descritas como complexas e controversas. Nas igrejas protestantes a revolução nazista foi, no início, acolhida com benévola simpatia, tendo o nazismo procurado identificar-se com o patriotismo alemão, e algumas personalidades protestantes simpatizantes dos nacionais socialistas. Em julho de 1933, os representantes das igrejas protestantes alemães escreveram uma constituição para a criação de uma Igreja do Reich, criada a partir da fusão das 28 igrejas luteranas e reformistas alemães, que englobavam em torno de 48 milhões de adeptos, e era considerada a "igreja oficial" do regime. Hitler utilizou o simbolismo cristão para propaganda em meio ao povo alemão, esmagadoramente cristão. O anonimato lhes era garantido ao tirar a importância do individuo e colocá-la no povo enquanto nação. 

No festival nórdico do Solstício de Verão, perante uma enorme multidão reunida em Hesselberg (montanha a qual o Führer declarou sagrada), ao lado de uma grande fogueira simbólica, Julius Streicher, amigo de Hitler disse: "Se olharmos para as chamas deste fogo sagrado e nelas lançarmos os nossos pecados, poderemos baixar desta montanha com as nossas almas limpas. Não precisamos nem de padres nem de pastores". Via-se já a cisão com as igrejas cristãs, protestante e católica. 

Eram os protestantes anglo-saxões brancos, WASP (White Anglo-Saxon Protestants), o grupo social onde se sustentava a KKK, onde se basearam inicialmente a doutrina do nacional socialismo alemão e também os alcoólicos anônimos. Grupos de poder incontestável dentro da sociedade norte-americana e européia. 

Antes de se conhecerem, Bill e Bob faziam parte do chamado Grupo Oxford, que tinha entre seus propósitos a intenção de difundir a aplicabilidade de valores espirituais considerados pelos grupos universais, na vida cotidiana, que vieram, posteriormente, a marcar as características filosóficas do A.A. Enquanto Bill, sob a influência do Grupo Oxford, vinha conseguindo, havia já algum tempo, manter-se em abstinência, o mesmo não acontecia com o Dr. Bob. Como conseqüência deste encontro, os dois se propuseram a trabalhar com pacientes alcoólicos no Hospital Municipal de Akron, onde tiveram sucesso com um interno que, junto com eles mesmos, constituíram o primeiro grupo do A.A. 

Em 1939, é publicado o livro “Alcoólicos Anônimos” que acaba por dar nome à sociedade recém-formada. Nesse livro, considerado a obra básica da irmandade, os doze passos estão delineados e constituem os princípios de todo o processo de recuperação. Essa teoria se cabe qualificá-la assim, ganha a antipatia dos fundamentalistas cristãos nos quais inicialmente se apoiava e que, agora, passam a ser desconsiderados na perspectiva do A.A., citando, por exemplo, o fato do Dr. Bob se referir à Bíblia como “O Bom Livro” e não como “A Palavra de Deus” e pela sua afinidade com um pastor liberal que negava a divindade de Cristo. 

Entretanto, uma perspectiva interessante é perceber que os doze passos do A.A. tomam por base os sete princípios da Associação Unitária Universalista, uma religião liberal baseada em princípios humanísticos e seus sete princípios. No livro, pode-se perceber que o que se chamou de doze passos era uma adaptação livre feita por Bill, dos princípios de Oxford, que os modificou de maneira a retirar a base fundamentalista cristã, com o objetivo de torná-los mais amplamente aceitáveis através das fronteiras culturais e religiosas com a finalidade de combater o alcoolismo. 

Outra influência marcante no A.A. resulta da relação entre Bill e Jung. Numa de suas cartas a Jung fica clara sua influência na criação do A.A.: “... embora o senhor certamente já tenha ouvido falar de nós, duvido que se lembre de certa conversa que um dia teve em seu consultório com um de seus pacientes, Roland H., lá pelos meados dos anos 30, e que teve uma influência decisiva na criação de nossa irmandade”. Bill continuava a carta lembrando a Jung o que Roland lhe contou sobre sua consulta com ele. 

Escreveu: “Quando Roland lhe perguntou se havia esperança para alguém como ele, o senhor disse que poderia haver, desde que ele fosse capaz de se transformar em sujeito de uma experiência espiritual e religiosa e de uma conversão genuína. O senhor recomendou que ele se colocasse numa atmosfera religiosa e que tivesse esperança num melhor porvir. Essa sua citação tão cândida e humilde foi, sem sombra de dúvida, a pedra fundamental sobre a qual, desde então, nossa irmandade vem se alicerçando”. 

É óbvio que, no que concerne a Jung, ele jamais teria se referido a uma conversão ao cristianismo, já que ele acreditava que a religião é um mito e uma forma simbólica da mente interpretar a vida. Para Jung a conversão significava tão somente uma experiência dramática capaz de alterar a compreensão da vida. Ele mesmo rejeitava o cristianismo e a prática da idolatria. Ele substituiu Deus por uma miríade de arquétipos mitológicos. Para ele não havia necessidade de doutrina ou credo para que a conversão se desse; apenas a experiência, única e pessoal. 

Em sua resposta a Bill, referindo-se a Roland, ele diz: “A dependência dele ao álcool é equivalente, num nível mais baixo, à sede espiritual do ser pela inteireza encontrada na comunhão com Deus; um conceito medieval”. Mencionava ainda que: “em latim, a mesma palavra é usada para álcool e para a experiência religiosa mais sublime”. No inglês, spirits é uma forma de se nomear o álcool. 

Conhecendo-se a teologia de Jung e o aconselhamento baseado num espírito familiar, conclui-se que o espírito a que ele se referia não era o Espírito Santo, nem o deus de que ele falava era o Deus da Bíblia, mas sim um espírito falsificado, disfarçado de anjo de luz e capaz de levar muitos à destruição. 

O A.A. é baseado numa idéia antiga de que vício é desvio de caráter. O programa estigmatiza o paciente, e dá à sociedade uma visão deturpada do alcoolismo. A maioria dos dependentes tem outros problemas psiquiátricos. Quem chega ao A.A. nem sempre está assim diagnosticado e, segundo seu conceito original, é aconselhado a não usar remédios, considerados como outro tipo de drogas. Um quarto dos dependentes tem alguma comorbidade. Não faz sentido frequentar o A.A. e não tratar as causas. As recaídas fazem parte do processo de recuperação, mas no A.A. elas são consideradas um fracasso pessoal. 

Voltando ao caráter dogmático, existe dentro do A.A. um movimento de coação e submissão à crença em um poder superior. A visão de que esse poder superior pode ser concebido como isso ou aquilo é uma mera estratégia dentro dos grupos para encaminhar, gradativamente, a pessoa à crença em um deus. E isso não se dá somente por parte dos membros, está implícito na literatura de A.A., o que implica em intolerância aos agnósticos e ateus. O próprio Bill assume que, “sem a dependência em um deus ou nos princípios de A.A., fatalmente morreremos". São interpretações idiossincráticas ou literais dos princípios da fé – neste caso, a Bíblia. 

A doutrina da impotência de alcoólicos anônimos é uma de suas crenças religiosas mais centrais. É um dos pontos onde o A.A. afasta radicalmente o cristianismo ou qualquer outra religião e adentra o reino bizarro dos cultos dogmáticos quase medievais. O A.A. ensina que os alcoólatras são incapazes de gerir suas próprias vidas e devem entregar o controle ao grupo e ao poder superior que irá controlá-los e libertá-los. 

Bill Wilson rotineiramente citou a idéia de "impotente" e a teoria da doença do alcoolismo para explicar seu mau comportamento anterior; alegremente descobriu que a teoria da doença do alcoolismo aliviava o seu sentimento da culpa, que não era realmente dele, devido à sua impotência. Um tanto estranho já que o exército de salvação vinha ensinando desde 1890 que o alcoolismo era uma doença. O grupo de Oxford ensinava a mesma coisa Bill Wilson foi um membro do grupo de Oxford. Porque sua surpresa? 

Enquanto o A.A. insiste em fazer que o membro se sinta culpado de tudo que o alcoolismo lhe causou, usam como método dizer que o alcoólatra é extremamente egoísta porque escolheu a garrafa em detrimento da família, amigos, carreira ou qualquer outra coisa. Se isso fosse verdade, então existia o poder de escolha, que implica não estar impotente perante o álcool. Portanto, o primeiro dos doze passos lança sobre o alcoólico a primeira de muitas contradições que ele terá de aceitar sem argumentar, enquanto pertencer à irmandade. Uma vez aceita essa premissa, aceitar a seguinte não parece tão difícil. O membro “descobre” que é o culpado e pessoalmente responsável por tudo, inclusive a doença. 

Um contraste absurdo e que é muito preocupante é o conceito de ego inflado que, em princípio, todo alcoólatra tem; não é incomum ver pessoas muitíssimo humildes dizendo que querem desinflar o próprio ego. Que lhes resta depois disso? O que essa doutrina terá a oferecer já que tem um efeito potencialmente destrutivo da psique, reduzidas para o resto da vida a uma dependência emocional e subordinação mental aos grupos. São literalmente desinflados e assim permanecem. 

É nesse contexto doutrinário, que Bill comete, o maior erro carregado até os dias de hoje pelo A.A. Se por um lado teve o apoio dos fundamentalistas protestantes, por outro buscou sustentação na visão Filosófica de Jung, estabelecendo um contracenso intransponível, mas que visava abrir a irmandade para o máximo de pessoas possível, independentemente, em teoria, de seus credos e práticas religiosas. 

O segundo erro de Bill diz respeito a tentar conceitualizar a enfermidade (alcoólica), definido-a como doença física, emocional e espiritual. Percebe-se, entretanto, que a classificação de doenças CID-10 da OMS, quando trata do alcoolismo como doença, não faz absolutamente nenhuma referência a qualquer coisa que se relacione com o emocional e menos ainda ao espiritual. Tampouco o faz o DSM IV da American Psychiatric Association. 

Ao ignorar a medicina e equivocar-se na correta situação do A.A. entre as religiões, termina criando uma irmandade onde se estabelecem importantes matizes de uma prática religiosa ortodoxa e fundamentalista e uma suposta aceitação de qualquer outro credo, desde que todos se submetam à mais absoluta entrega aos princípios dogmáticos indiscutíveis, vistos como solução única para a doença. Tal afirmação fica clara quando se analisa o conteúdo dos três primeiros passos. 

“Admitimos que éramos impotentes perante o álcool - que tínhamos perdido o domínio sobre nossas vidas.” 

Aqui as pessoas são levadas a admitir sua mais absoluta impotência em relação ao álcool, que parece assumir vida, vontade e razão, como uma divindade do mal, a encarnação do demônio na mais primitiva das representações alegóricas. As pessoas não são impotentes perante o álcool, mas sim perante uma doença que deve ser tratada. A dificuldade de largar a dependência não é impotência, é uma doença, essa sim impotência causada por substância química. Se beber ficou fora do controle, não é o álcool o responsável, mas sim a dependência criada pela sua ingestão. Deixar o álcool pode ser difícil assim como deixar o tabaco, o chocolate ou qualquer outra substância. É uma doença, física e mental. Quem se dispõe a admitir a derrota completa? Todos os instintos naturais reagem contra a idéia de que somente um ato da Providência pode dar fim à impotência pessoal. Nenhuma outra forma de falência é igual a esta. Uma vez aceita, a total derrocada está completa. Acaba-se acreditando que somente através dessa derrota absoluta é que os alcoólatras são capazes de dar os primeiros passos em direção à libertação. 

Assim, o objetivo real do primeiro passo é preparar os novos membros para os passos dois e três, onde eles irão confessar que são absolutamente incapazes e precisam entregar suas vontades e suas vidas aos cuidados de um deus e do grupo de alcoólicos anônimos. 

“Viemos a acreditar que um Poder Superior a nós mesmos poderia devolver-nos à sanidade.” 

A partir daqui, aqueles que ingressam no A.A. são confrontados com um dilema assustador. Esse dilema aparece em várias formas de expressão dos novos membros: "Olhem o que vocês fizeram conosco. Convenceram-nos de que somos alcoólicos e que nossas vidas são ingovernáveis. Havendo nos reduzido a um estado de desespero absoluto, agora nos informam que somente um Poder Superior poderá resolver nossa obsessão. Alguns de nós nos recusamos a acreditar em Deus, outros não conseguem acreditar e ainda outros acreditam na existência de Deus, mas de forma alguma supõe que Ele levará a cabo este milagre”. No segundo passo se ensina às pessoas que elas perderam a sanidade e que só um poder sobrenatural pode restaurá-los à vida o que significa que eles são indefesos e não podem curar-se pela medicina ou por si mesmos. 

“Decidimos entregar nossa vontade e nossa vida aos cuidados de um Poder Superior, na forma em que O concebíamos.” 

Em seguida, o terceiro passo ensina um estilo de vida de dependência passiva onde os membros entregam a responsabilidade de suas vidas ao “deus como nós o concebíamos", e assim esperam nesse deus resolver todos os seus problemas, para que possam seguir em frente. 

A eficácia de todo programa de A.A. dependerá de quão bem o alcoólico tenha sido convencido do dualismo Céu x Inferno, Deus x diabo, álcool x saúde, abstinência x vitória, submissão x impotência. A prática do Terceiro Passo é como abrir uma porta até então fechada. Quando a porta se abre nos dois primeiros passos olhando-se através dela ver-se-á um caminho, ao lado do qual há uma inscrição que diz: "Eis o caminho em direção àquela doutrina que realmente funciona." Essas conclusões não requerem ação; requerem apenas aceitação. No A.A., o dependente é tratado como pecador e deve aceitar um programa espiritual para ser curado. Em última instância, trocar uma droga por outra. 

Os dependentes de álcool, em sua grande maioria, reclamam da ausência de atendimento médico qualificado que satisfaça às suas necessidades e anseios. Primeiro falta assistência preventiva e, em consequência disso, instala-se a patologia; depois, por falta de diagnóstico precoce há um açodamento da doença e, por fim, falta auxílio eficaz para se deter e controlar essa mesma doença. Nessa última fase, quando o dependente sente os efeitos mais contundentes da moléstia e quase sempre busca amparo para suas agruras, percebe que a medicina que diagnostica sua patologia não disponibiliza suporte terapêutico para a manutenção da sobriedade. 

Essa mesma medicina cuida apenas dos efeitos secundários da doença, ou das doenças correlacionadas, tanto a respeito dos órgãos (todos) afetados pelos efeitos do álcool, quanto dos problemas de ordem psiquiátrica advindos de seu uso prolongado. Para a dependência de álcool propriamente dita, os médicos apenas recomendam a abstinência. É aí que o A.A. aparece como última alternativa desesperada de salvação, mesmo que para alcançá-la tenha-se que abdicar da própria identidade, substituindo-a pela identidade do grupo. 

Finalmente, a visão da eficácia do A.A. tende a ser superestimada, fruto do comportamento dogmático e doutrinário da irmandade. Na verdade, a OMS afirma que menos de 1% dos dependentes de álcool estão em tratamento, e destes, apenas algo em torno de 0,3% estão filiados ao A.A. Embora estudos científicos não sejam uma tarefa simples no que diz respeito ao A.A., visto que não se conseguiria pontos de vista isentos da visão dogmática, deve-se continuar a tentar avaliar os benefícios que o alcoólico possa realmente ter ao se submeter a essa doutrina fundamentalista. 

Fica claro que qualquer tipo de benefício que possa ser alcançado, se é que algum existe, pela participação no A.A. deve estar suportado por terapia de apoio, tratamento psiquiátrico quando indicado e uma conscientização maior dos membros na busca de uma recuperação consistente, livre de visões doutrinárias, dogmáticas, em fim, fundamentalistas.