Tomografias e ressonâncias magnéticas mostram que o excesso de bebida “reesculpe” conexões cerebrais, destruindo a capacidade de a pessoa sentir prazer sem beber e de agir conscientemente. Não é à toa que, a cada ano, 500 mil pessoas se internam em clínicas de desintoxicação nos EUA e outro 1 milhão procura o Alcoólicos Anônimos (AA). No Brasil, levantamento do Hospital das Clínicas (SP) aponta que 15% da população abusa de álcool.Apesar de a Organização Mundial da Saúde reconhecer o alcoolismo como doença desde 1967, muita gente ainda acredita que parar de beber é, sobretudo, questão de força de vontade. Avanços recentes nas técnicas de imagem cerebral, entretanto, comprovaram que a dificuldade de se livrar do vício é muito mais resultado de falhas do cérebro do que de falta de determinação.
As alterações que a bebida provoca no cérebro ajudam a entender por que mesmo os métodos mais eficientes de combate ao vício, como o do quase septuagenário AA, apresentam taxas de sucesso que não ultrapassam 50%.
“As pesquisas feitas a partir de imagens do cérebro de alcoólatras corroboraram o que a gente já sabia pela observação. Os pacientes bebem compulsivamente porque o excesso de álcool provoca alterações cerebrais, e não por serem sem-vergonhas”.
Após cair na corrente sangüínea, o álcool segue para uma região do cérebro conhecida como núcleo accumbens, onde ocorre um aumento de concentração de dopamina-neurotransmissor ligado à sensação de prazer.
O consumo abundante e repetido da bebida faz com que a ligação entre álcool e prazer fique registrada no córtex frontal. É essa memória que cria a obsessão pelo álcool, transformando o beber social em compulsão. Estudos recentes com animais em laboratório indicam que a bebida também modifica a estrutura dos gânglios basais, causando danos semelhantes aos observados em portadores de transtorno obsessivo-compulsivo.
O cérebro reprogramado pelo álcool passa a demandar martinis, uísques e vodcas com freqüência e em quantidades cada vez maiores. Uma imagem do drinque é suficiente para detonar o desejo incontrolável de beber, como demonstram imagens do cérebro de alcoólatras em recuperação.
Medicamentos
Além de derrubar de vez o mito de que o alcoólatra não abandona o vício porque não quer ou porque é fraco, os avanços nas técnicas de neuroimagem estão ajudando também no desenvolvimento de medicamentos que aumentam as chances de cura.
É o caso do acamprosato, já disponível no mercado brasileiro e que alivia os sintomas da síndrome de abstinência e, assim, ajuda a evitar recaídas. A prescrição para indivíduos com insuficiência hepática ou renal é sua única contra-indicação.
Outro medicamento também disponível no mercado brasileiro, o naltrexone também diminui a compulsão e ajuda o alcoólatra a permanecer abstinente. Antes desse medicamento, a única droga aprovada nos EUA para tratar a dependência do álcool era o dissulfiram.
O medicamento impede que o álcool ingerido seja metabolizado e causa náuseas, aumento da pressão arterial, rubor facial e grande desconforto em quem bebe. “Ele funciona como um breque psicológico e ajuda o paciente a mudar de hábito, mas não diminui o desejo”. Os novos medicamentos aumentam as chances de sucesso, mas não são panacéia e só surtem efeito quando combinados a tratamentos tradicionais, como terapia cognitiva (em que o paciente discute o que o leva a beber e aprende estratégias para se afastar do vício) e aconselhamento grupal.
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