A maconha é a substância ilícita mais
consumida pelas mulheres em idade gestacional. Utilizada secularmente em algumas
culturas orientais, começou a ganhar popularidade na Europa a partir do século XVI.
Alvo de constantes polêmicas ao longo dos séculos, o consumo da maconha sempre alternou
períodos de maior e menor aceitação. Nos últimos tempos, em virtude de novas polêmicas,
a substância voltou a ser bastante estudada.
Ainda preso a discussões apaixonadas,
por vezes baseadas em dogmas ou tabus, o consumo de maconha carece ainda de mais
e melhores estudos, para que o tema possa receber a importância que merece. O consumo
de maconha durante a gestação enfrenta o mesmo problema. Os estudos são recentes
e as conclusões, incompletas. Além disso, boa parte destes é retrospectiva (baseada
em informações de prontuários ou entrevistas com a gestante após o final da gestação),
o que tornam imprecisas informações importantes, tais como a dose consumida, o período
da gestação em que o consumo se deu, a presença de outros fatores (além da maconha)
que poderiam causar danos semelhantes aos encontrados.
Alguns estudos afirmam que a maconha
parece não possuir ação teratogênica, isto é, não causa malformações à constituição
física do feto. Parece também, não afetar significativamente o andamento da gestação.
Estudos demonstram que a maconha é capaz de aumentar a frequência e a intensidade
das contrações uterinas. Esse aumento, no entanto, parece não está associado ao
trabalho de parto prematuro. O princípio ativo da maconha (delta-9-THC) mostrou-se
capaz de diminuir a concentração sanguínea de hormônio luteinizante (LH) e de prolactina,
sem ação sobre o hormônio folículo-estimulante (FSH), em estudos animais. Isso gerou
um aumento do tempo da gestação e aumento dos índices de natimortos. A repercussão
disso em seres humanos, no entanto, é desconhecida e parece não ser observada na
prática clínica.
A redução de peso e tamanho ao nascer
foi detectada por alguns estudos. Tal diferença, no entanto, parece desaparecer
até o final do primeiro ano de vida. Nas primeiras semanas de vida, os achados são
divergentes. Há aqueles que detectaram sintomas neurológicos nos primeiros dias
de vida (tremores, espasmos espontâneos e dificuldades de sucção quando amamentados)
e outros que não encontraram qualquer diferença, mesmo entre usuárias pesadas.
O maior problema para os recém-nascidos
expostos à maconha durante a gestação refere-se aos processos cognitivos superiores
(atenção, memória, raciocínio.). Como a estruturação destes continua se desenvolver
até a puberdade, essas alterações são detectadas tardiamente. Parece haver alterações
relacionadas à estabilidade da atenção e prejuízos na aquisição de informações de
natureza não-verbal. Isso parece não afetar a inteligência global. Porém, repercutem
de maneira negativa sobre os processos relacionados ao planejamento e a avaliação
das respostas captadas do ambiente externo. Há, ainda, relatos de impulsividade,
hiperatividade e distúrbios de conduta entre esses indivíduos. De qualquer maneira, a maconha parece interferir de algum modo sobre o desenvolvimento
do psiquismo infantil, podendo causar prejuízos em alguns casos.
Na tentativa de descobrir quais as consequências do
uso de maconha na gravidez, uma equipe de neonatologistas, psicólogos e psiquiatras
da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) investigou como a droga interfere
no desenvolvimento neurológico do feto. A análise de bebês cujas mães consumiram
maconha nos três últimos meses de gravidez constatou, nos primeiros dias de vida,
que eles eram mais estressados, menos sensíveis a estímulos externos, mais chorões
e mais difíceis de serem acalmados de crises de choro do que bebês que não foram
expostos à droga.
A maconha é a droga ilícita mais consumida do mundo
e cujos efeitos são os menos estudados. Para
chegar a essa conclusão, os pesquisadores avaliaram a coordenação motora, o reflexo,
o tônus e procuraram sinais de estresse em 561 filhos de mães adolescentes saudáveis.
Foram estudados bebês com peso apropriado
para a idade gestacional de 37 a 42 semanas que não enfrentaram nenhuma dificuldade
durante o parto e cujas mães não consumiram nenhum outro tipo de droga durante a
gravidez. Por meio da análise do fio de cabelo das adolescentes, o grupo detectou
que 26 delas tinham consumido maconha nos últimos meses de gestação.
O teste foi confirmado com o estudo das
primeiras fezes da criança, onde também foram encontrados resíduos da droga. Durante os exames, os bebês que
tiveram contato com a maconha se mostraram mais inquietos, desatentos e estressados.
Os pesquisadores observaram que eles tinham um sono conturbado e mais dificuldade
de acordar. Neles, aqueles tremores e movimentos bruscos, bastante comuns entre
recém-nascidos, apareceram com mais frequência.
Entre os testes para avaliar a atenção das
crianças, os pesquisadores observaram sua capacidade de acompanhar com os olhos
o movimento de uma bola vermelha, movimentada em frente ao rosto de cada uma delas.
Algumas das que foram expostas à maconha mal olharam para a bola e a maioria delas
demonstrou pouco interesse. Os cientistas utilizaram outros objetos como um chocalho
e um apito para testar a reação a estímulos visuais e sonoros e concluíram que estas
crianças eram mais desatentas.
Esse comportamento alterado nas primeiras
72 horas de vida significa que podem existir problemas na formação do cérebro dos
bebês; é provável que o consumo de maconha pela mãe altere no bebê a comunicação
entre os neurônios acionada pelo neurotransmissor dopamina e associada ao controle
de sensações como a excitação e a irritabilidade.
O desenvolvimento do cérebro não depende
apenas de fatores biológicos, mas também do ambiente e da maneira como esses bebês
serão criados. Pequenos detalhes como a atenção, o cuidado, a disponibilidade da
mãe e de outros familiares de estarem sempre perto, estimulando a percepção do bebê
com brincadeiras e com afetividade, são decisivos para sua formação.
Sabendo disso, os pesquisadores decidiram
traçar um perfil social, econômico e psicológico dessas mães adolescentes, para
ter uma ideia do ambiente em que eles serão criados e quais as chances de obter
um desenvolvimento saudável. O perfil foi traçado a partir de entrevistas com todas
as 928 mães adolescentes que tiveram filhos durante os dois anos de estudo. Nesse
número estão incluídas as 561 mães que participaram da pesquisa sobre a maconha
e as demais mães adolescentes que haviam sido excluídas do estudo porque não atendiam
ao padrão de saúde ou porque durante a gravidez consumiram outros tipos de droga.
Os pesquisadores encontraram um quadro desanimador:
uma em cada cinco adolescentes, com faixa etária média de 15 anos, já era mãe do
segundo filho e 90,4% delas estavam desempregadas. Mais de metade das meninas tinha
baixa renda e até sete anos de escolaridade. Durante a gestação, 294 contaram usar
álcool, 17 maconha e cocaína e 6 relataram uso de drogas injetáveis. Além disso,
8 em cada 10 adolescentes não pretendiam ser mães e por causa da gravidez 67,3%
pararam de estudar.
Para complicar ainda mais esse quadro, em
outro momento da vida, boa parte delas já tinha enfrentado problemas de violência
doméstica, 81 tinham sido atacadas com arma e 51 meninas foram vítimas de violência
sexual. Só no decorrer da gravidez a polícia precisou ser acionada em 21 ocasiões
para resolver conflitos domésticos. E, como se não bastassem dificuldades, como
a inexperiência da mãe adolescente e sua falta de maturidade, a equipe constatou
que uma em cada três jovens tinha pelo menos uma desordem psiquiátrica, um índice
bastante alto que provavelmente representa mais um obstáculo na criação e no crescimento
sadio da criança.
O diagnóstico mais frequente foi depressão,
transtorno do estresse pós-traumático e ansiedade. É bem provável que todos esses problemas
não tenham se desenvolvido de maneira independente. Alguns estudos sugerem que quanto
maior a pobreza, mais baixo o nível educacional e menor o suporte familiar, maiores
são as taxas de gravidez na adolescência, associada ao consumo de drogas. Agora
os pesquisadores pretendem acompanhar o crescimento dessas crianças tanto para descobrir
quais são os efeitos de longo prazo da exposição do feto à maconha como para auxiliar
e contribuir para seu desenvolvimento saudável.
No entanto, até o momento, o que a equipe
constatou foi que os efeitos provocados pela exposição do feto à maconha apenas
se somam a outros problemas encontrados no ambiente em que essas crianças irão crescer
– alguns deles são sérios como a exposição à violência – e que provavelmente interferem
de modo significativo no futuro delas.
Estou
ótima, não posso usar alguma coisa só de vez em quando?
Tudo bem que tem um bebezinho
crescendo aí na sua barriga, mas, mesmo assim -- pensa você --, a vida continua
e, de vez em quando, dá aquela vontade de badalar e curtir as coisas de sempre com
os amigos, incluindo as eventuais drogas recreativas que apareçam pelo caminho.
Sim, você tem toda razão
que a "vida continua" e já se sabe há muito tempo que gravidez não é doença
ou motivo para as mulheres ficarem isoladas ou de cama. O problema é que tudo que
entra no seu corpo passa para o nenê através da corrente sanguínea e da placenta, principalmente substâncias químicas.
O bebê acaba sendo um consumir
de drogas também, mesmo sem ter feito essa escolha. Ele é muito pequenininho para
isso, os efeitos das substâncias no corpo e especialmente no cérebro dele podem
durar para sempre.
Se você faz parte de um
grupo que bebe muito e usa
drogas, às vezes tem que fazer a opção de se afastar. A futura mãe precisa investir
na saúde da família como um todo e no ambiente em que a criança crescerá. Isso inclui
também o cigarro, motivo pelo qual os especialistas aconselham as futuras mães a parar de fumar.
Aí pode vir alguém e dizer
para você que maconha é uma planta, uma substância da natureza que não vai fazer
mal nem para você e nem para o seu filho. Só que o que as pesquisas mais recentes
mostram não é bem assim.
Por mais que o filho de
uma mulher que usou drogas nasça com a aparência normal, o comportamento da criança
poderá não ser normal, nem na fase de bebê nem mais para a frente, quando já tiver
idade de frequentar um colégio, segundo um estudo sobre uso de drogas por adolescentes
na gravidez da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Crianças cujas mães consumiram
maconha durante a gravidez tenderam a ser mais irritadas, mais impulsivas e menos
atentas -- características que podem comprometer, e muito, a vida escolar, profissional,
emocional e social de qualquer pessoa e de qualquer família.
Toda
droga tem o mesmo efeito na gravidez?
Veja a seguir alguns dados
mais específicos sobre os efeitos que outras substâncias tóxicas podem ter na gestação
e no feto:
Cocaína:
A cocaína é um poderoso
estimulante do sistema nervoso central e seu uso na gravidez pode causar problemas
bem graves e, em certos casos, irreversíveis. No primeiro trimestre, pode aumentar
as chances de um aborto espontâneo e nos últimos meses, de um parto
prematuro.
Além disso, pode levar
a placenta a se separar da parede uterina antes da hora do parto -- uma condição
conhecida como descolamento de placenta, que
provoca forte sangramento e pode ser fatal tanto para a mãe como para o bebê.
A maior parte dos bebês
expostos ao uso de cocaína antes do nascimento não necessariamente terá uma anomalia,
mas pesquisas indicam que correm sim mais riscos de isso acontecer (e os riscos
são maiores conforme a frequência com que a mãe consome a droga). Algumas das anomalias
associadas à cocaína são defeitos cerebrais, no rosto, nos olhos, coração, intestino
e órgãos genitais do bebê.
Outro problema é que filhos
de usuárias muitas vezes passam por crises de abstinência da droga, tendo maior
dificuldade para ser confortados e se assustando ao menor toque ou barulho. Esse
tipo de complicação pode durar de oito a dez semanas depois do nascimento ou até
mais.
Ecstasy:
De acordo com uma pesquisa
do Serviço de Informações de Teratologia Britânico, houve maior número de más-formações
(especialmente de membros e coração) entre os bebês de consumidoras de ecstasy,
especialmente se associado a outras drogas, do que de mães que não tomavam nada.
Heroína:
A heroína provoca diversos
efeitos negativos no bebê em desenvolvimento, como menor crescimento fetal, nascimento
prematuro -- cerca de metade dos filhos de mães viciadas em heroína nasce antes
do tempo e até a morte mesmo antes do nascimento.
Crianças expostas à heroína
durante a vida uterina costumam sofrer sintomas fortíssimos de crise de abstinência
depois do parto, necessitando de tratamento que pode levar semanas. Entre os sintomas
estão irritabilidade, desassossego e dificuldade de comer e respirar, e só especialistas
no assunto são treinados para lidar corretamente e de maneira segura com esse tipo
de situação.
Tem
como parar?
Independentemente de você
ser uma usuária casual de drogas ou fazer uso pesado delas, parar nem sempre é fácil,
mesmo durante a gravidez. É uma decisão que exige coragem e muitas vezes uma mudança
radical de estilo de vida por um bebê que você nem conhece ainda ou ama.
Por mais que a decisão
seja exclusivamente sua, é sempre bom ter ajuda por perto nessas horas. Não deixe
de comentar com o médico ou a enfermeira que acompanha seu pré-natal se você usou
ou usa algum tipo de droga. Provavelmente vai dar vergonha de falar, mas lembre-se
de que eles são profissionais que já viram coisa muito pior e são treinados para
auxiliar e cuidar dos seus pacientes da melhor maneira possível.
Você certamente não será
a primeira grávida nessa situação que eles conheceram e sua vontade de se informar
mostrará o quanto você se importa com a saúde do bebê que está para chegar. Profissionais
de saúde também têm o compromisso de não contar para ninguém o que é discutido dentro
do consultório.
E quem
usou sem saber que estava grávida? Vai fazer mal para o bebê?
O primeiro passo é realmente
não usar mais nada, para não correr mais risco nenhum, ainda que seja no finalzinho
da gravidez. Não pense que agora já não vai fazer mais diferença. Faz sim. Procure não ficar desesperada achando que seu
filho vai nascer com mil problemas. A verdade é que não dá para ter certeza, por
isso é tão importante fazer um pré-natal direitinho,
com todas as consultas e ultrassons que forem pedidos.
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