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5/30/2014

ALCOOLISMO FEMININO

Vários estudos mostram as diferenças de gênero na incidência e prevalência no uso de álcool, sendo que as mulheres apresentam menor prevalência no uso de substâncias psicoativas, incluindo o álcool. 

Porém esta diferença tem diminuído consideravelmente, o que pode ser atribuído à conquista da igualdade de direitos entre homens e mulheres, resultantes das lutas e movimentos feministas das décadas de 1960 a 1980, desencadeando uma tendência também em relação à igualdade no consumo de drogas, verificada pela mudança no estilo de vida que a mulher adquiriu juntamente com seus novos papéis e responsabilidades.

Além das características específicas nas mulheres, existem outros fatores, chamados de predisponentes, que são ambientais, culturais, por influência da mídia, bem como os fatores psicológicos individuais.

Os fatores demográficos (idade, estado civil, etnia e ocupação), em consonância com outros aspectos como predisposição genética, fatores psicológicos e socioculturais, exercem influência no comportamento das mulheres e contribuem para determinar o início e o comportamento na evolução do beber problemático.

O alcoolismo entre meninas de 12 a 17 anos dobrou de 2001 para 2005: passou de 3,5% para 6%. A proporção de alcoolistas alcançou a razão de uma mulher para cada três homens (CEBRID, 2001, 2005). 

Percebe-se, então, que o universo feminino está cada vez mais sensível ao uso de álcool, em virtude das mudanças ocorridas no seu modus vivendi e que, apesar da preocupação do Ministério da Saúde e dos esforços de diversos profissionais, existem muitos entraves ou barreiras pessoais para que a mulher alcoolista receba atendimento e tratamento diferenciados.

Muitas são as dificuldades encontradas para que a mulher alcoolista procure ajuda, começando pelo local de tratamento, pelo acolhimento, pelo profissional que a recebe e pela proposta de tratamento oferecida. 

Além disso, os tabus sociais, a estigmatização e a culpa são alguns dos fatores que dificultam a procura de tratamento. 2% das mulheres com problemas relacionados ao álcool procuram tratamento, contra 8% dos homens.

O panorama atual com o aumento de consumo, abuso e dependência do álcool pelas mulheres, bem como suas possíveis consequências constituem um problema que merece atenção e implica a necessidade de se obter mais conhecimento acerca deste universo feminino. 

Nesse sentido, o objetivo deste artigo foi o de conhecer o perfil das mulheres alcoolistas, as circunstâncias do início do uso do álcool e as condições reguladoras da busca por tratamento.

Porque as mulheres são mais sensíveis aos efeitos do álcool?

As mulheres são mais sensíveis aos efeitos do álcool. Vários estudos tem mostrado esta predominância, porém sem determinar a causa exata. Sabe-se que as mulheres têm níveis menores de uma enzima conhecida como desidrogenase lática. Esta enzima é responsável pela "digestão" do álcool diminuindo a quantidade de álcool que chega a corrente sanguínea. 

Por isso, a maioria das mulheres sente mais os efeitos do álcool mesmo quando com menor quantidade ingerida, se comparada com um homem. A enzima desidrogenase láctica (LDH) está presente em muitos tecidos, especialmente no coração, fígado, rins, músculos do esqueleto, células do cérebro e dos pulmões. 

Alcoolismo e câncer

Smith-Warner et al. (1998), analisando seis estudos de corte conduzidos em quatro países distintos, investigaram a associação entre o risco do câncer de mama do tipo invasivo e o consumo de álcool. Mais de 300 mil mulheres avaliadas por até 11 anos foram incluídas no estudo, com cerca de 4.300 diagnosticadas de câncer mamário. 

A quantidade, bem como o tipo de bebida alcoólica consumida pela grande maioria das pacientes, não interferiu no aumento do risco relativo para câncer de mama. Entre aquelas que bebiam em maior quantidade e frequência, entretanto, o aumento do consumo esteve linearmente relacionado com o aumento do risco para câncer, assim como a redução do consumo alcoólico interferiu positivamente na diminuição do mesmo risco. 

Mulheres habituadas a ingerir de 2,5 a 5 drinques por dia apresentam probabilidade 40% maior de desenvolver câncer de mama. Esse risco aumenta 9% para cada 10 gramas de álcool (cerca de um drinque) diárias.

Alcoolismo e osteoporose

Outro aspecto importante do consumo crônico de álcool pelas mulheres é a sua relação com a osteoporose. Considera-se que a osteoporose resulta do desequilíbrio de um complexo sistema, mantido por vários fatores nutricionais, hormonais e metabólicos. 

As dependentes de álcool apresentam frequentemente hipocalcemia, hipomagnesemia e hipoparatireodismo, acarretando disfunções que levam à osteoporose. O efeito inibidor da remodelação óssea do álcool é fenômeno bem conhecido em ambos os sexos. Mulheres com menos de sessenta anos que tomam de dois a seis drinques por dia têm risco maior de fratura de colo de fêmur e de antebraço.

Doenças cardiovasculares

A análise dos dados de dezenas de milhares de mulheres acompanhadas no “Nurses’ Health Study” revelou que tomar dois ou três drinques diários aumenta o risco de surgir hipertensão arterial em 40% e a probabilidade de acontecer derrame cerebral hemorrágico. 

Nas mulheres que bebem mais do que três drinques por dia o risco de hipertensão arterial duplica. Mulheres que abusam de álcool desenvolvem também miocardiopatias mesmo usando doses mais baixas do que os homens.

Distúrbios psiquiátricos

Todos eles são mais prevalentes em mulheres que abusam de álcool do que em homens que o fazem e do que em mulheres abstêmias. A única patologia mais frequente no alcoolismo masculino é a personalidade antissocial. A prevalência de depressão em mulheres que abusam de álcool é de 30% a 40%. 

Estudos demonstram que a maior parte dessas mulheres bebe como forma de se livrar dos sintomas associados a quadros de depressão primária. Anorexia e bulimia estão presentes em 15% a 32% das que abusam de álcool. Mulheres que abusam de álcool tentam o suicídio quatro vezes mais frequentemente do que as abstêmias.

Consequências psicossociais

Problemas familiares são mais comuns entre mulheres que abusam de álcool (entre os homens são os problemas legais e aqueles relacionados com o trabalho). O alcoolismo torna as mulheres mais sujeitas a agressões físicas. Mulheres que consomem quantidades exageradas de álcool geralmente vivem com parceiros que também abusam da bebida.

Álcool e Gravidez

O uso de álcool durante a gravidez pode trazer inúmeros problemas para a criança, incluindo hiperatividade, déficits de atenção, aprendizado e memória. 

Diversos fatores podem contribuir para o surgimento de problemas no feto: padrão de consumo de álcool, metabolismo materno, suscetibilidade genética, período da gestação em que o álcool foi consumido e vulnerabilidade das diferentes regiões cerebrais da criança. 

Atualmente sabe-se que os riscos para o feto aumentam com o nível de consumo e a frequência de uso.

A mais grave das consequências relacionadas ao consumo de álcool durante a gestação é a Síndrome Fetal Alcoólica (SFA) que foi descrita pela primeira vez por Jones e Smith em 1973. 

A criança com SFA apresenta algumas anormalidades faciais e exibe déficit intelectual, problemas cognitivos e problemas comportamentais. Apesar de apresentar inúmeras limitações intelectuais, a criança com SFA apresenta boa performance nos testes de linguagem, mas ainda assim apresenta dificuldades nos testes de aritmética e em seu desenvolvimento sócio emocional.

Para que o diagnóstico de síndrome fetal alcoólica seja feito é necessário que o paciente seja avaliado por um pediatra. Isto porque outras doenças que promovem atraso no desenvolvimento neuropsicomotor da criança podem estar presentes ou se confundir com a SFA. 

Não há uma abordagem terapêutica desenvolvida diretamente para SFA. Complicações clínicas, tais como convulsões ou cardiopatias, requerem tratamentos específicos. O mesmo se aplica à presença de transtornos psiquiátricos associados. 

Alguns fatores protetores contra complicações sociais e psicológicas já foram identificados como por exemplo: 

· - Relacionamentos familiares estáveis
· - Diagnóstico da síndrome antes dos seis anos de idade
· - Ausência de violência física
· - Rotina estável e imune a mudanças periódicas de residência ou cidade
· - Ausência de privações sociais
· - Presença de acompanhamento especializado 

O retardo mental, uma vez estabelecida sua gravidade, deve receber a atenção necessária em serviços especializados. Problemas motores, tais como descoordenação e déficits parecem ter boa resposta a tratamentos fisioterápicos. 

Não se deve, no entanto, abordar o problema de modo restrito. Medicar um transtorno psiquiátrico, cuidar de alterações oftalmológicas, procurar uma escola especial ou proporcionar a criança atendimento psicológico ou fisioterápico são fundamentais, mas somente eficazes se associados e concomitantes. 

Deve haver um plano de tratamento e comunicação constante entre todos os profissionais e familiares envolvidos. 

Outra grave consequência do uso de álcool durante a gravidez é o chamado Efeitos Relacionados ao Álcool (ERA). Crianças que apresentam ERA apresentam algumas das características dos pacientes com Síndrome Fetal Alcoólica, mas geralmente exibem melhor performance nos testes de inteligência. Existem três formas de ERA:

a. Parcial: crianças que apresentam algumas alterações faciais e comprometimentos neurológicos. 
b. Malformações Congênitas: crianças que apresentam uma ou mais anormalidades congênitas, incluindo anormalidades cardíacas, auditivas, renais e esqueléticas. 
c. Desordem Neuropsicomotoras: crianças que apresentam déficits em sua capacidade de aprendizado, especialmente em aritmética e em seu desenvolvimento sócio emocional. Em comparação com a Síndrome do Alcoolismo Fetal, a Desordem Neuropsicomotora Relacionada ao Álcool atinge um número maior de crianças e seus sintomas (incluindo déficit cognitivo) são menos severos do que os sintomas apresentados por crianças com SFA. 

Consequências para o feto

A ingestão de álcool durante a gravidez pode provocar distúrbios fetais que vão, do retardo de desenvolvimento, à chamada síndrome alcoólica fetal, caracterizada por anormalidades físicas comportamentais e cognitivas. Consumo de álcool durante a gravidez é considerado a principal causa evitável dessas anormalidades na infância.

Filhos de alcoólatras podem apresentar perturbações do seu comportamento, tais como hiperatividade, dificuldades de linguagem e de aprendizagem, descoordenação de movimentos, desenvolvimento emocional retardado e atraso mental. 

Os sintomas da SAF tanto podem ser leves como extremamente sérios. Variam desde a falta de capacidade de concentração, o que se torna evidente na idade escolar, às dramáticas malformações e anomalias acima mencionadas. 

À medida que as crianças crescem, a maior parte das anomalias externas desaparece. Contudo, as deficiências mentais subsistem na maioria dos casos. Estudos cobrindo o período do nascimento à adolescência e levados a cabo em crianças que sofrem do SAF provam os fatos expostos. Dez anos mais tarde, dois terços das crianças estavam atrasados ou eram deficientes mentais. Mais de 80% não conseguiram completar a escolaridade.