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9/01/2018

Pilares na prevenção do uso de álcool e outras drogas


Pilares na prevenção do uso de álcool e outras drogas


Amandio Teixeira
Isabel Scott
O papel da família
A família é um ponto chave no tratamento terapêutico de dependentes químicos. A todo o momento, o ser humano é cobrado e influenciado pelo meio social em que vive e esse meio também determina como ele deve agir pensar e se comportar. Se ele fugir às normas sociais consequentemente será “punido” pela sociedade.
Com isso, a todo o momento o indivíduo se sente “vigiado” por esta e, em última instância, por ele mesmo. Sendo assim, o nível de estresse ao qual é submetido todos os dias é alto, saindo às vezes do “normal” para o descontrole.
Nem mesmo na condição de dependente químico, o indivíduo se livra da cobrança e do julgamento social – ao contrário – a cobrança passa a ser muito maior e, como não pode mais obedecer às regras sociais, passa a ser excluído de todo o convívio em sociedade, seja na escola, no trabalho ou até mesmo na família.
A família em muitos casos faz parte deste processo de exclusão do doente, muitas vezes por medo, desconhecimento, ou simplesmente pelo estigma de ter em seu convívio um doente tido pela sociedade como alguém sem capacidades, “louco” ou “drogado”.
Percebemos as dificuldades e a carga psicológica às quais as famílias estão expostas; porém é essencial todo e qualquer apoio nestes casos, sendo de suma importância seu envolvimento e participação durante todo o tratamento terapêutico vivenciado pelo paciente, a fim de conhecer e entender melhor a problemática, tornando-se parte deste processo.
Além do preconceito que os dependentes químicos sofrem da sociedade, eles também são submetidos aos da família, que se sente envergonhada da sociedade pelo simples fato de não terem conseguido formar um indivíduo “saudável” e preparado para cumprir com suas obrigações sociais.
Não é possível julgá-las, pois também são vítimas da sociedade assim como o doente, mas é possível reconhecer a importância dela na vida de qualquer ser humano.
Os familiares são fundamentais no processo de tratamento do doente. No entanto, necessitam saber como lidar com as situações estressantes, evitando comentários críticos ou se tornando exageradamente superprotetores, dois fatores que reconhecidamente provocam recaídas.
Torna-se muito importante que os familiares dosem o grau de exigências em relação ao doente, não exigindo mais do que ele pode realizar em dado momento, mas sem deixá-lo abandonado, ou sem participação na vida familiar.
Conhecendo melhor a doença e tendo um diagnóstico claro, a família passa a ser um aliado eficiente em conjunto com a medicação e a terapêutica trabalhada pela equipe multiprofissional.
Ao mesmo tempo em que se trata o quadro de doença do paciente, a família deve receber total atenção no sentido de ser orientada em sua abordagem ao paciente ou em sua dinâmica de relacionamento durante o processo terapêutico, visto que em muitos casos a família adoece em conjunto, sendo necessário um processo de escuta, apoio e orientação.
Trabalhar com famílias traz à tona traços relacionados à dinâmica funcional familiar muitas vezes já cristalizados ao longo do tempo e que necessitam ser repensados e apreendidos.
Orientação familiar
Educação em saúde é fundamental para assegurar não só o entendimento do doente, como também de sua família, sobre os problemas relacionados ao uso crônico de álcool. Assim como é imprescindível a orientação do paciente sobre o seu problema, a família, parte integrante dessa disfunção, precisa ser informada e encaminhada para um tratamento mais intensivo, se necessário.
Em qualquer dos níveis de comprometimento que o indivíduo apresente, é essencial trabalhar os conceitos de síndrome de dependência e abstinência alcoólica, com objetivo claro de desenvolver, nesse sistema familiar, a análise crítica sobre seu papel nesse transtorno, como também promover sua mudança de pensamento e comportamento.
Trabalhar a autoestima e a importância da desintoxicação, assim como a prevenção da recaída, são estratégias a serem adotadas nessa fase inicial do tratamento, não só com o paciente, como também com seu sistema familiar e social.
Como falar sobre drogas com os filhos
Reconhecendo que os pais exercem grande influência sobre o consumo precoce dos filhos, damos algumas dicas para conversar sobre o assunto em casa, começando pelo álcool. A idade ideal para começar a falar sobre os efeitos do álcool é a partir dos nove anos de idade.
Dê o exemplo: Se você bebe, não cometa exageros. Não se gabe por beber nem menospreze aqueles que não bebem. Não dirija embriagado nem seja tolerante com quem o faz. Se você não bebe, converse sobre o álcool e explique o que motivou sua opção.
Seja realista: Apresente fatos concretos. Os efeitos imediatos e nocivos da bebida são os principais argumentos. Ensine que o álcool atrapalha o desenvolvimento físico, mental, social e espiritual.
Processo terapêutico familiar
O processo terapêutico é o momento onde o paciente passa por cuidados efetivos exercidos pela equipe multiprofissional tendo por finalidade o tratamento dos sintomas de sua doença e a manutenção e garantia de sua continuidade no tratamento tendo o suporte adequado para este fim, visando sua recuperação e melhora.
É neste momento também que estão lado a lado a equipe multidisciplinar e os familiares do paciente, juntos pelo mesmo objetivo - o da melhora e qualidade de vida do paciente.
Diante desde complexo cotidiano, as ações dirigidas às famílias devem estruturar-se de modo a favorecer e fortalecer a relação familiar/profissional/serviço, entendendo que o familiar e fundamental no tratamento dispensado ao doente.
Durante o processo terapêutico onde os familiares estão inseridos e participantes, conseguem lidar com menos apreensão e assim oferecer cuidados de melhor qualidade ao doente, principalmente quando estão inseridos em reuniões e/ou grupos de família ou em outros processos, sendo estes espaços propícios para a reflexão, discussão, escuta, troca de vivências, angústias e orientações, constituindo-se estes como efetivos espaços privilegiados de atendimento familiar.
Os pacientes sofrem e suas famílias também necessitam ser atendidas pela equipe respeitando sua forma de constituição, porem levando em consideração os vínculos estabelecidos e a dinâmica funcional, reconhecendo e respeitando suas limitações, procurando trabalhar preconceitos e outras formas de entendimento da situação e do problema do paciente.
A relação familiar é o sustentáculo e a base para uma boa estrutura emocional para o paciente, tanto para a prevenção de uma crise, quanto para sua manutenção e recuperação, fato pelo qual se torna essencial sua participação em todos os processos terapêuticos no qual o paciente esteja inserido, o que irá propiciar uma melhor adequação do tratamento e consequente melhora.
O papel da religião
Profissionais da saúde, pesquisadores e a população em geral reconhecem, cada vez mais, a importância da dimensão religiosa e espiritual para a saúde.
Diversos estudos científicos sobre as relações entre saúde e espiritualidade estão presentes em diversos centros de pesquisas espalhados pelo mundo e esses estudos apontam que crenças e práticas religiosas estão associadas a uma melhor saúde física e mental, incluindo melhor qualidade de vida.
Há um consistente e diversificado corpo de evidências indicando a relevância da religiosidade e da espiritualidade na saúde mental, de tal maneira que discutir ou pesquisar se essa relação benéfica entre espiritualidade e saúde é válida ou não já está ultrapassada.
Em relação à saúde mental, existem milhares de pesquisas. A maior parte sugere uma associação do envolvimento religioso com maiores níveis de satisfação de vida, tais como:
  • Sensação de bem estar;
  • Senso de propósito;
  • Significado da vida;
  • Esperança;
  • Otimismo;
  • Estabilidade nos casamentos;
  • Menores índices de ansiedade e depressão;
  • Menores índices de abuso de substâncias.
Outros estudos demonstram que pessoas com envolvimento religioso têm menor probabilidade de:
  • Usar e abusar de álcool e drogas;
  • Apresentar comportamentos de risco, como o sexo sem proteção, delinquência e crime, especialmente os adolescentes.
Ainda entre os adolescentes, o envolvimento religioso também é relacionado a menores taxas de suicídio e de atividade sexual precoce e consequente gravidez prematura.
O que nos cabe hoje, em ciência moderna, como profissionais de saúde mental, é encontrar as nossas dificuldades em lidar com esses assuntos na prática diária. Essas dificuldades passam por tópicos desde carência de treinamento em temas dessa natureza até os sistemas de crenças diversos de cada profissional, que podem gerar dificuldades em lidar com as crenças religiosas dos pacientes.
Os conceitos de religiosidade e espiritualidade
Espiritualidade e religião parecem a mesma coisa. Mas não são.
Antes de iniciar o estudo sobre o tema, é de extrema importância definir os conceitos de espiritualidade e religiosidade, uma vez que existe um infindável debate epistemológico na utilização desses conceitos.
Há várias definições para esses dois vocábulos, mas apresentamos aquelas que nos parecem mais simples e mais perto do que consideramos adequado:
Espiritualidade é uma busca pessoal pela compreensão das questões da vida, de seu significado e da relação com o sagrado e o transcendente, podendo ou não conduzir ou originar rituais religiosos e formação de comunidades.
Religião é um sistema organizado de crenças, práticas, rituais e símbolos, destinados a facilitar a proximidade com o sagrado e o transcendente: Deus ou uma força superior, nominadas ou não.
Prática religiosa funcional
  • Reduz a ansiedade existencial;
  • Fonte de esperança e sensação de bem estar emocional;
  • Promove coesão social;
  • Fornece identidade ao unir pessoas em torno de um ideal comum;
  • Orientação moral que diminui estilo de vida autodestrutivo;
  • Sensação de controle ao se unir com uma força onipotente;
  • Diminui a ansiedade da morte;
  • Desperta segurança para enfrentar dor e sofrimento;
  • Fonte de solução de conflitos emocionais e situacionais.
Prática religiosa disfuncional
  • Gera culpa patológica;
  • Diminui a autoestima;
  • Gera ansiedade e medo por meio de crenças punitivas;
  • Obstáculo para o crescimento pessoal;
  • Favorece o conformismo e a sugestionabilidade;
  • Inibe a expressão de sensações sexuais;
  • Fonte de paranoia.
Interação com líderes religiosos
Por vezes pode ocorrer oposição entre questões religiosas e o tratamento oferecido. Nestes casos pode ser de grande valia contar com o líder religioso, depois de autorizado pelo paciente, nunca com postura de confronto, mas sempre tentando trabalhar em conjunto. Normalmente ao perceber postura não hostil e atuação colaborativa, o líder passa a estimular a adesão da paciente ao tratamento.
Critérios sugestivos de experiências espirituais saudáveis
  • Ausência de sofrimento psicológico;
  • Ausência de prejuízos sociais e ocupacionais;
  • Existe uma atitude crítica sobre a realidade objetiva da experiência;
  • Existe compatibilidade da experiência com algum grupo cultural ou religioso;
  • Ausência de comorbidades;
  • A experiência é controlada;
  • A experiência gera crescimento pessoal;
  • A experiência é voltada para os outros.
Tratamentos com abordagem religiosa e espiritual
A APA (Associação Psiquiátrica Americana) recomenda que os psiquiatras respeitem e considerem com relevância a identidade cultural, espiritual e religiosa dos pacientes ao decidir por um tratamento. Esclarece que as crenças religiosas e espirituais podem ser importantes fontes de esperança e significado.
Cita o programa de 12 passos, com uma dimensão espiritual, como importante para o tratamento. Considera que as comunidades religiosas e espirituais facilitem a reintegração social e oferecem estabilidade, inspiração e apoio prático para os membros mentalmente doentes.
O papel da fé
Fica claro que a busca pela fé está diretamente ligada à história de dependência química, pois quando questionados sobre “em que momento da sua vida sentiram necessidade de procurar uma religião ou desenvolver sua espiritualidade” a maioria relata que foi no pior momento que tiveram quando ainda usavam drogas.
Observa-se também que esses momentos estão ligados a rupturas drásticas na já frágil estabilidade emocional dos dependentes tais como: brigas e separação familiar, perda de emprego, perdas financeiras, discriminação generalizada, isolamento, etc.
Outro fator importante de estresse durante a dependência química é o tratamento e internação psiquiátrica, 40% dos sujeitos sentiram necessidade de buscar apoio religioso/espiritual nesse momento da vida.
Assim, a religião influencia o modo como as pessoas lidam com situações de estresse, sofrimento e problemas vitais. A religiosidade pode proporcionar à pessoa maior aceitação, firmeza e adaptação a situações difíceis de vida, gerando paz, autoconfiança e perdão, além de permitir o despertar de uma imagem mais positiva de si mesmo.
É notório, porém, que esse despertar para fé, não acontece apenas por uma situação única e isolada, mas como a “gota d’água”, isto é, parte dos recorrentes conflitos causados pelo consumo de drogas, que na maioria das vezes é decorrente de uma desestruturação existencial e comportamental.
Quando inquiridos sobre qual a importância que a fé teve na recuperação de sua doença pode-se dizer que muitos dependentes encaram a fé como a salvação de suas vidas e como suporte indispensável para alcançar a abstinência e conseguir manter-se assim.
Esses são aspectos responsáveis pelo sucesso de programas que abordam a espiritualidade/religiosidade no tratamento contra as drogas.
Aproximar a espiritualidade ao tratamento convencional ainda representa uma tarefa muito difícil para a psiquiatria. Entretanto, todo indivíduo tem a necessidade de ser tratado como pessoa completa num contexto biológico psicológico sociológico e espiritual.
Talvez se o tratamento psiquiátrico ao qual são submetidos tiver, em algum momento, um aporte espiritual, estejamos na verdade conseguindo abordar da forma mais abrangente possível todos os recursos capazes de levar à recuperação.
A fé como proteção à recaída
Os indivíduos de menos idade são os que menos atribuem à espiritualidade e à religiosidade o caráter de fator protetor para manter-se longe das drogas. Eles são os que mais cedo fazem uso de substâncias de dependência e que também usam um número maior no que se refere à diversidade de substâncias. Entretanto, vários pesquisadores concluem que quanto maior a importância dada à religião, menor o envolvimento com drogas.
Ainda que existam outros fatores que contribuam para a mudança de conduta dos dependentes químicos, é a espiritualidade desenvolvida ao longo de alguns meses, através do contato com a informação religiosa, que os faz permanecer no caminho da abstinência - pessoas que há mais de dois anos estão abstêmios demonstram uma estreita relação com a religião professada e a ela atribuem o principal fator da manutenção da abstinência.
As questões que tratam do apoio de membros da instituição religiosa têm significativa relevância, confirmando que a religião não promove apenas a abstinência do consumo de drogas, mas, em especial, oferece recursos sociais de reestruturação: nova rede de amizades, ocupação do tempo livre em trabalhos voluntários, atendimento “psicológico” individualizado, valorização das potencialidades individuais, coesão do grupo e apoio incondicional dos líderes religiosos, sem julgamentos.
A religiosidade controla indiretamente as atitudes frente ao consumo de drogas através da percepção do perigo de usar. Em especial, os aspectos de suporte social oferecido pela igreja ficam mais evidentes, pois realiza um forte acolhimento, demonstra mais zelo, preocupação e cuidado com os seus membros. A importância da igreja como suporte social também é destacada por algumas pessoas em recuperação.
Na igreja, o fiel passa a seguir as regras adotadas e passa a respeitar as normas e valores determinados pela religião. Naturalmente essas normas levam a um distanciamento das drogas, devido à conscientização gradual da degradação moral associada ao seu uso e também pelo receio da rejeição por parte dos outros membros da igreja.
A gratidão que o dependente químico tem pela instituição religiosa, apoiado na fé, afasta-o de atitudes e comportamentos que não estejam de acordo com a moral difundida pela religião.
O papel da oração
Pesquisas demonstram que a oração parece ser a ferramenta mais adotada para evitar a fissura e lidar com as dificuldades, uma vez que 80,0% dos dependentes fazem orações nessas ocasiões.
Este aspecto demonstra que a devoção pessoal, expressa essencialmente pelas orações dirigidas a Deus, mostra-se inversamente associada ao abuso e à dependência das drogas e é o principal método de tratamento da síndrome de abstinência e de qualquer sintoma de recaída associada à fissura.
É utilizada sempre que surge a vontade de usar e sempre que os dependentes sentem necessidade de “conversar com Deus”. A oração atua também como um ansiolítico, pois além de promover a fé, é nesse momento que o indivíduo divide suas angústias, sua luta diária contra a vontade de consumir drogas, confiante na resposta que terá do Divino.
O papel dos grupos de mútuo ajuda
Alcoólicos Anônimos e Narcóticos Anônimos são irmandades mundiais de homens e mulheres que se ajudam mutuamente a permanecerem sóbrios. Eles oferecem a mesma ajuda a qualquer um que tenha um problema com a bebida/drogas e queira parar.
Por serem todos dependentes químicos, eles tem uma compreensão mutua especial. Sabem como essa doença os atinge – e aprenderam como se recuperar dentro de A.A /N.A.
Cada grupo realiza reuniões regulares, nas quais os membros relatam entre si suas experiências - geralmente em relação aos "Doze Passos" sugeridos para a recuperação, e às "Doze Tradições" sugeridas para as relações dentro da Irmandade e com a comunidade de fora.
Muitas pessoas não aceitarão a nossa mensagem. As pessoas que estão no “caminho fácil que leva para o inferno” não se mostrarão entusiasmadas em submeter-se aos passos claramente definidos no caminho para a recuperação. Mas, para aqueles que ouvirem a nossa história poderá ser a diferença entre a vida e a morte.
São seguramente os primeiros a falarem em espiritualidade para seus membros, gente com uma história de sofrimento absurdo em função de sua toxicodependência/alcoolismo, desvinculando esse conceito de um modelo tradicional de religião. Isso pode ser verificado no próprio preâmbulo de AA:
Alcoólicos anônimos é uma irmandade de homens e mulheres que compartilham suas experiências, forças e esperanças a fim de resolver o seu problema comum e ajudarem outros a se recuperarem do alcoolismo. O único requisito para se tornar membro é o desejo de parar de beber.
Para ser membro de A.A. não há necessidade de se pagar taxas nem mensalidades somos autossuficientes graças às nossas próprias contribuições. A.A. não está ligado a nenhuma seita ou religião, nenhum movimento político, nenhuma organização ou instituição não deseja entrar em qualquer controvérsia; não apoia nem combate quaisquer causas. Nosso propósito primordial é mantermo-nos sóbrios e ajudar outros alcoólicos a alcançarem a sobriedade.
Essas características podem ser responsáveis pela imensa capacidade de agregar em um mesmo espaço pessoas tão diferentes. Mas outra relação menos conhecida do Programa de Doze Passos está de fato intimamente ligada ao convívio religioso.
O papel dos tratamentos psicossociais
O alcoolismo é uma doença incurável, de determinação fatal e progressiva até mesmo em períodos de abstinência, entretanto, existem tratamentos para interromper o crescimento da doença, como veremos a seguir.
As psicoterapias descritas mais adiante têm sido usadas no tratamento dos transtornos causados pelo uso do álcool. Vários autores fizeram revisões da eficácia das várias psicoterapias para tais transtornos.
Este tópico faz revisões dos resultados na literatura sobre terapias comportamentais cognitivas, terapias comportamentais, terapias psicodinâmicas/interpessoais, intervenções breves, terapia conjugal e familiar, terapia de grupo, after care e grupos de autoajuda.

Terapias comportamentais cognitivas

Existem muitas evidências de que os tratamentos comportamentais cognitivos que objetivam a melhora do autocontrole e das habilidades sociais levam consistentemente à redução do alcoolismo.
Estratégias de autocontrole incluem estabelecimento de metas, automonitorização, análise funcional dos antecedentes do alcoolismo e possibilidades de aprendizagem de alternativas para enfrentamento de situações conflitivas.
O treinamento das capacidades sociais concentra-se em desenvolver habilidades para formar e manter relações interpessoais mais estáveis, positividade e recusa para aceitar bebidas.
Intervenções em terapia cognitiva concentradas em identificar e modificar pensamentos mal adaptativos e que não incluam um componente comportamental não têm sido tão efetivas quanto os tratamentos comportamentais cognitivos.
O treinamento do autocontrole consiste em estratégias cognitivas e comportamentais, inclusive automonitorização, estabelecimento de metas, recompensas para obtenção de metas, análise funcional de situações propícias para beber e aprendizagem das habilidades alternativas para enfrentamento do problema com bebidas.
Embora alguns estudos de treinamento de autocontrole comportamental tenham incluído alcoolismo controlado, bem como abstinência, como objetivo do tratamento, as técnicas comportamentais de autocontrole devem ser utilizadas com o objetivo explícito a longo prazo de abstinência.
Em vários estudos, o aumento das respostas de enfrentamento ou “auto eficácia” ao final do tratamento predisseram melhores resultados com a bebida durante o acompanhamento.
Os indivíduos que relatam uso mais frequente de estratégias cognitivas ou comportamentais com intuito de resolver ou dominar o problema (“enfrentamento por aproximação”) tipicamente têm melhores resultados que aqueles que dependem de ficar distantes das situações de alto risco (“enfrentamento por evitar”).

Terapias comportamentais

A terapia comportamental individual e a conjugal têm demonstrado efetividade para pacientes com transtornos causados pelo uso do álcool.
A abordagem mais estudada do tratamento de pacientes com transtornos causados pelo uso do álcool é a abordagem do reforço da comunidade, que utiliza princípios comportamentais e, geralmente, inclui terapia conjunta, treinamento para encontrar trabalho, aconselhamento enfocado em atividades sociais e recreativas livres de álcool.
Usando designação aleatória para reforço da comunidade ou tratamentos hospitalares padronizados, observa-se que os pacientes no grupo de reforço da comunidade bebem menos, passam menos dias longe de casa, trabalham mais dias e são menos institucionalizados durante um acompanhamento de 24 meses.

Terapias psicodinâmicas/interpessoais

Há poucas evidências empíricas de estudos controlados de que a psicoterapia orientada pelo insight ou aconselhamento são tratamentos efetivos para o alcoolismo.
A psicoterapia individual produz melhores resultados que uma condição de controle e a terapia de grupo orientada psicodinamicamente produz melhores resultados.
Abordagens genéricas de aconselhamento (caracterizadas como primariamente diretivas e de apoio) produzem melhores resultados que os controles.

Terapia conjugal e familiar

O estado do relacionamento do paciente com familiares ou outras pessoas igualmente significativas pode ser fator crítico no ambiente pós-tratamento para pacientes que sejam casados ou que vivam com a família.
Comparando a terapia conjugal comportamental e a terapia conjugal interacional com um grupo-controle sem tratamento evidencia que ambos os grupos de tratamento mostram melhor evolução no ajuste conjugal, e os grupos de terapia conjugal mostram maior grau de sobriedade no decorrer de um período de acompanhamento a curto prazo.
Pacientes que recebem terapia conjugal comportamental começam a ter melhores resultados com relação ao alcoolismo que aqueles que não a tem.
O envolvimento do cônjuge no tratamento leva à melhora dos resultados conjugais e do uso do álcool precocemente no período pós-tratamento, que os pacientes em terapia conjunta têm menor probabilidade de abandonar o tratamento, e que a terapia com o intuito de melhorar o casamento como um todo parece funcionar melhor que a terapia de casais concentrada rigidamente nos problemas relacionados ao álcool.

Intervenções Breves

As intervenções breves, em geral, são oferecidas por uma a três sessões e incluem uma avaliação abreviada da gravidade do alcoolismo e de problemas relacionados e fornecimento de feedback motivacional, além de aconselhamento.
As intervenções breves: a) são tipicamente mais efetivas (em termos de uso do álcool, saúde geral ou funcionamento social); b) muitas vezes têm eficácia comparável à de programas tradicionais mais intensos e a mais longo prazo; c) aumentam a efetividade do tratamento posterior. Mesmo as intervenções que sejam muito breves (isto é, de algumas horas) podem ter algum efeito positivo.
Intervenções breves são utilizadas tipicamente (e têm mais sucesso) para pacientes afetados menos gravemente e que não tenham recebido tratamento anterior para um transtorno com o álcool.
São necessárias mais pesquisas para determinar quais pacientes são otimamente servidos pelo recebimento de uma intervenção breve.
Terapia Ocupacional
A Terapia Ocupacional tem como um dos objetivos, resgatar a autonomia, a qualidade de vida e o contato consigo mesmo, centra-se na relação terapeuta-sujeito-atividade.
É no fazer, ou seja na ocupação humana, (atividades manuais ou corporais, expressivas, individual ou grupal) que a Terapia Ocupacional traz a possibilidade de auxiliar o paciente em sua busca pela construção e reconstrução de sua história, é buscar a significação nos fazeres, exceto no vício.
Dentro desse contexto o trabalho da Terapia Ocupacional em conjunto com a equipe multidisciplinar (psicólogos, enfermeiros, psicopedagogos, psiquiatras, educadores físicos) torna-se de fundamental importância para o tratamento de dependentes químicos e alcoolistas.
Grupo terapia
A integração em grupos de terapia é um ponto fundamental na ajuda à libertação do alcoólico e no tratamento do alcoolismo. Para que o tratamento do alcoolismo seja eficaz é essencial que o alcoólatra aceite a sua condição e opte por se integrar nos conteúdos programáticos direcionados para deixar o álcool. Esta modalidade de tratamento consiste nos grupos de apoio e de ajuda mútua, como os Alcoólicos Anônimos – AA, que são os mais conhecidos, mas há outros grupos.
A diferença entre terapia em grupo de autoajuda é que na terapia há um moderador ou supervisor de grupo, normalmente um terapeuta, psicólogo, psiquiatra ou outro tipo de profissional. Já os grupos de ajuda mútua são pessoas que enfrentam o alcoolismo juntas, ou seja, uma ajudando a outra. Um dos fatores de sucesso na recuperação mais importantes nestes grupos é que, os mais experientes e a mais tempo “limpos” ajudam os que estão no começo do tratamento.
O papel da escola
A adolescência é como uma etapa de transição, um período psicossociológico entre a infância e a vida adulta, fruto da organização da nossa sociedade tal como a conhecemos. Um dos fatores mais marcantes durante a adolescência é a busca dos jovens por um grupo que os defina.
Ainda que durante a adolescência a família continue ocupando um lugar preferencial como contexto socializador, à medida que vão se desvinculando de seus pais, as relações com os companheiros ganham em importância, em intensidade e em estabilidade e o grupo de iguais passa a ser o contexto de socialização mais influente. Esse fenômeno acontece basicamente na convivência escolar diária.
A escola, por ser um elemento de presença forte para os jovens e - juntamente com a família - responsável pela educação destes de forma global, tendo as ferramentas necessárias para proporcionar prevenção ao uso de drogas.
O trabalho com drogas pode vir a ser feito em três níveis - prevenção, repressão e tratamento. A prevenção divide-se em duas etapas: prevenção primária que procura desestimular a primeira experiência dos não iniciados e a prevenção secundária que busca prevenir o aprofundamento do uso experimental.
A prevenção coloca-se portanto como imperativo desse processo já que o tratamento de pessoas já em dependência é longo, difícil, aleatório e caro. Quanto mais precoce, maiores são as possibilidades de eficácia da mesma.
Ela pode vir a seguir vários modelos: princípio moral (uso de drogas como algo condenável do ponto de vista ético e moral), amedrontamento (enfatiza aspectos negativos e perigosos das drogas), conhecimento científico (propõe fornecimento de informação de modo imparcial e científico), educação afetiva (modificação dos fatores predisponentes ao uso de drogas), estilo de vida saudável e pressão de grupo positiva (o grupo como fator de proteção do jovem contra as drogas).
Quando se considera a prevenção no contexto escolar deve-se dar ênfase no investimento da formação de profissionais qualificados, bem treinados e habilidosos para lidar com as demandas da instituição.
Deve também buscar envolver o corpo escolar inteiro e colocar o adolescente como participante ativo do processo de elaboração dos projetos utilizando linguagem acessível e escutando o que ele tem a dizer sobre sua realidade.
Na impossibilidade de excluir as drogas do domínio social há que se trabalhar visando à construção de profissionais mais preparados para enfrentar os problemas causados por elas. A prevenção entra, portanto como parte da formação dentro do ambiente escolar.
É papel do psicólogo escolar/educacional junto ao corpo discente da escola a elaboração, desenvolvimento e acompanhamento de projetos de prevenção ao uso de drogas.
Deve ainda trabalhar junto a projetos que visem à construção de uma identidade pessoal (autoestima, socialização, disciplina, organização) e participação social (conscientização de papéis sociais e cidadania responsável).
O trabalho deve ser realizado junto ao jovem buscando valorizar as nuances de seu caráter e propiciar um ambiente favorável para que elabore os possíveis fatores relativos ao seu contexto social ou sua subjetividade que possam vir a influir na procura pelo uso de entorpecentes.
Os grupos que geralmente servem como meio de iniciação do uso de drogas podem vir a ser revertidos favoravelmente e servir como fator de segurança contra o uso de drogas.
O papel do esporte
O estímulo das práticas desportivas são, comprovadamente, um caminho alternativo seguro e pouco dispendioso para a prevenção do uso de drogas pelos jovens. De uma maneira geral as crianças quando são inseridas em esportes, qualquer que seja, crescem sabendo mais, tendo mais informações dos malefícios que as drogas causam. Isto é, de maneira geral, os clubes e academias sempre fazem palestras sobre este assunto.
O esporte pode ser um aliado na luta pelo combate as drogas. Por via pacífica é um caminho que já provou ser bem mais eficaz que punições severas. Através do esporte, crianças e jovens são atraídos para a convivência em grupo marcada pela solidariedade.
A necessidade de respeitar os limites estabelecidos e as regras da competição acabam se tornando um aprendizado essencial ao processo do desenvolvimento humano.
É um estilo de vida marcado pela disciplina e pelo prazer. Ao conviver em grupo com pessoas que têm um objetivo comum, a criança tende a se socializar e a absorver as coisas boas daquela comunidade.
Praticando o esporte, se aprende a ganhar e perder. E mais, se aprende a conviver em equipe. Tudo isso dentro de um ambiente de diversão, mas, com responsabilidade. O potencial educativo e de socialização do esporte é muito maior do que se imagina.
Exercitar-se e ultrapassar a cada dia os próprios limites do corpo e da mente, como único objetivo de subir mais um degrau, direciona o atleta. O resultado é uma vida centrada, saudável e, com certeza, mais distante do mundo das drogas.
Cidadania não se recebe num passe de mágica. Cidadania se conquista. E pode ser conquistada, através da cultura, da educação, do lazer e do esporte. Para isso, que outro caminho melhor que o esporte para as crianças?
No caso do futebol, por exemplo, é no campo onde se enfrentam jogadores que despontam os principais preceitos de uma sociedade democrática que respeita, de fato, seus cidadãos.
O jovem que corre atrás da bola dribla preconceitos, trabalha com itens de conduta fundamentais para sua formação: liderança, espirito de coletividade e igualdade de forças. Além disso, é o esporte que oferece maior facilidade de ascensão social, para aqueles menos favorecidos.
A ajuda de treinadores e árbitros é fundamental, pois oferecem o sentido de justiça nessa pequena estrutura social que vira uma festa quando surge um gol. Cidadania também se conquista com sonhos, com utopia e projetos para o futuro.



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