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10/11/2015

O sentido do suicídio

Os suicidas têm uma propensão patológica pela morte, à qual eles verdadeiramente resistem, sem que possam, no entanto, suprimir. A vida atingiu neles um tal desequilíbrio que nenhum motivo de ordem racional pode mais consolidá-la. Nenhum suicídio procede unicamente de uma reflexão sobre a inutilidade do mundo ou sobre o vazio da vida.

Refletir longamente sobre a morte ou sobre outras questões angustiantes traz à vida um golpe mais ou menos decisivo - mas não é menos verdade que este gênero de tormento possa afetar somente um ser já atingido. Os homens nunca se suicidam por razões exteriores, mas devido a um desequilíbrio interno, orgânico. 

Os mesmos eventos deixam alguns indiferentes, marcam outros e conduzem uns poucos ao suicídio. Para chegar à obsessão de causar a própria a morte, deve-se passar por tanto tormento, tanto suplício, um colapso das barreiras interiores tão violento, que a vida não é mais do que uma sinistra agitação, uma vertigem, um turbilhão trágico. 

Como o suicídio poderia ser então uma afirmação da vida? Dizemos que ele é provocado pelas decepções: isto significa que desejamos a vida e que esperamos mais do que ela pode dar. Que falsa dialética! - Como se o suicida não tivesse vivido antes de morrer; como se ele não tivesse tido ambição, esperança, dor ou desespero! 

No suicídio, importa o fato de não mais se poder viver - fato que deriva, não de um capricho, mas da mais espantosa tragédia interior. E reivindica-se que não mais poder viver é afirmar a própria vida? Surpreendo-me com o fato de que se procure ainda uma hierarquia dos suicídios: nada de mais imbecil que querer classificá-los segundo a nobreza ou a vulgaridade das paixões. 

Já não impressiona o bastante por si só o desejo de se retirar da vida, sem que se tenha que buscar razões? Eu tenho o maior desprezo por aqueles que simulam suicídio por amor, pois eles são incapazes de compreender que um amor irrealizável represente, para o amante, uma impossibilidade de se definir, uma perda integral do seu ser. 

Um amor total, não realizado, somente pode conduzir ao colapso. Só duas categorias de homem suscitam minha admiração: aqueles que podem se tornar loucos a qualquer momento e aqueles que são capazes, a qualquer momento, de se suicidar. Apenas estes podem me impressionar, pois somente eles experimentam grandes paixões e conhecem grandes transfigurações. 



Aqueles que experimentam a vida de um modo positivo, na certeza de cada instante, como que encantados pelo passado, presente e futuro, não têm nada mais do que minha estima. Somente aqueles que estão em contato permanente com as realidades últimas me tocam realmente.

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