Escolha o Idioma

6/30/2015

Genialidade e loucura

Matemático, esquizofrênico e paranoico, John Forbes Nash foi um gênio. Reconhecido mundialmente por ganhar o Nobel de economia, o estudioso também acreditava que aliens o recrutaram para salvar o mundo. E sobre isso, Nash disse: “As minhas ideias sobrenaturais vieram da mesma maneira que as matemáticas. Por isso, decidi levar as duas igualmente a sério”.

E Nash está longe de ser o único gênio “louco” da história. Vincent Van Gogh, Virginia Woolf e Ernest Hemingway são apenas alguns exemplos de pessoas geniais que sofriam de doenças psicológicas. Exatamente por isso, muitos pensaram durante anos que a criatividade estava estritamente relacionada à psicopatologia.

Porém, psicólogos vêm afirmando que essa constatação pode ser um engano. Para eles, há dois fatos que reforçam o contraponto: há inúmeros gênios “normais” na história da humanidade; e manicômios não costumam produzir grandes finalidades criativas.

Então a ligação existe ou não? Estudos empíricos afirmam que sim, a genialidade possui uma forte relação com a loucura. O mais importante processo entre elas é a desinibição cognitiva: a tendência de prestar atenção a coisas que normalmente seriam ignoradas ou filtradas por parecerem irrelevantes.

Esse tipo de percepção foi o que motivou Alexander Fleming a descobrir a penicilina e muitos outros exemplos. O mesmo serve para o campo artístico, que normalmente valoriza as “coisas mundanas” e dá protagonismo à rotina, muito retratada na literatura, no cinema, na música, etc.

Contudo, a desinibição cognitiva é associada às patologias psicológicas. Por exemplo, esquizofrênicos acabam se bombardeando com informações que talvez pudessem ser “filtradas”. E segundo uma pesquisadora de Harvard, essa é uma diferença essencial entre os gênios e os “loucos”: agregar à sua máxima inteligência o conceito de desinibição.

“Inteligência excepcional pode ser útil, mas sem a cognição ela não consegue ser original e surpreendente”, conta Shelly Carson. Para ela, pessoas com QI elevado nem sempre são capazes de produções geniais.

As pessoas criativas, no entanto, caminham entre o normal e anormal, encontrando impulsos e ideias capazes de gerar conteúdos diferenciados. Como o matemático John Forbes Nash disse: “A racionalidade do pensamento impõe um limite na relação das pessoas com seus cosmos”.

Os mais célebres gênios criativos da história eram doentes mentais.

Renomados artistas, como Vicent Van Gogh e Frida Kahlo, e grandes literários, como Virginia Woolf e Edgar Allan Poe, podem ser enquadrados nesse contexto.

Hoje, a conexão entre genialidade e loucura já não é vista como mero acaso. Pesquisas mostram que esses dois extremos da mente estão realmente ligados, e os cientistas estão começando a entender o porquê?

Um grupo de especialistas debateu esse tema em um evento realizado no último dia 31, em Nova Iorque, como parte do 5º Festival Anual Mundial de Ciência.

A psicóloga clínica e professora da Johns Hopkins University School of Medicine, Kay Redfield Jamison, mostrou que os resultados de 20 ou 30 estudos científicos endossam a noção do “gênio atormentado”. Das muitas variedades de psicose, a criatividade parece estar mais fortemente ligada a transtornos de humor, especialmente o Transtorno Bipolar, doença com a qual Jamison já foi diagnosticada.

Um estudo testou, por exemplo, a inteligência de 700 mil suecos de 16 anos de idade. Após uma década, buscou-se saber quais deles haviam desenvolvido alguma doença mental.

Os surpreendentes resultados foram publicados em 2010. “Eles descobriram que pessoas que se sobressaiam com 16 anos eram quatro vezes mais propensas a desenvolver o Transtorno Bipolar”, afirmou a pesquisadora.

O Transtorno Bipolar causa dramáticas oscilações de humor. A pessoa vai da felicidade extrema à depressão grave.

Mas como isso poderia gerar um ciclo de criatividade? Um estudo apresentado por outro palestrante, o neurobiólogo da Universidade da Califórnia, James Fallon, sugere uma resposta. “As pessoas com esse problema tendem a ser criativas quando estão saindo de uma depressão profunda”, explicou Fallon.

Quando o humor do paciente bipolar melhora, seus ciclos de atividade cerebral também se desenvolvem. A atividade diminui na parte inferior do cérebro, conhecida como lobo frontal, e cresce numa parte superior. “Existe um nexo nessa dinâmica que tem a ver com bipolaridade e criatividade”, ressaltou o pesquisador.

Com relação à maneira como os padrões cerebrais se transformam em pensamento consciente, Elyn Saks, professor de Direito da Saúde Mental da Universidade da Califórnia do Sul, explicou que as pessoas com psicose não filtram os estímulos como a população normal.

Ao mesmo tempo, são capazes de entender e conectar as ideias contraditórias, ligando as associações soltas do cérebro, ato que o cérebro da maioria não veria lógica e por isso não enviaria para a consciência. “E se a invasão do absurdo no pensamento consciente pode ser esmagador e perturbador, pode também promover a criatividade”, disse Saks, que desenvolveu esquizofrenia durante a sua juventude.

Por exemplo: em uma pesquisa, foi pedido aos participantes para listar todas as palavras que viessem à mente tendo relação com determinada palavra de estímulo (como tulipa). O resultado demonstrou que os pacientes bipolares leves podem gerar três vezes mais associações de palavras em um dado período de tempo do que as pessoas em geral.

Quanto à forma como isso leva à genialidade, pode ser que a pura generosidade de ideias sem supressão provoque mais probabilidade de ele produzir algo profundo. Claro que ninguém está com energia criativa durante um ataque de depressão profunda ou esquizofrenia, até porque essas condições são debilitantes e até fatais.

Segundos os cientistas, mesmo com os benefícios da genialidade, os indivíduos nem sempre consideram que os seus momentos de brilho valem à pena frente ao extenso sofrimento que vem junto.

Saks concluiu dessa maneira: “Acho que a criatividade é apenas uma parte de algo que é essencialmente ruim”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário