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4/07/2015

Religião e uso de drogas por adolescentes

Paulo Dalgalarrondo
Meire Aparecida Soldera
Heleno Rodrigues Corrêa Filho
Cleide Aparecida M Silva
Introdução


A relação entre religiosidade e uso de álcool e drogas por adolescentes tem sido objeto de investigação de muitos pesquisadores, pois, para o adolescente, tanto o envolvimento e a prática religiosa como o uso de álcool e drogas são dimensões muito significativas de sua experiência pessoal e social. Essas dimensões têm significativo impacto sobre a saúde física e mental, sobre comportamentos de risco e sobre o desenvolvimento psicossocial do adolescente. Entender as relações entre essas duas dimensões é tarefa das mais importantes.

O uso e a dependência de álcool e drogas é um fenômeno complexo determinado por fatores genéticos, psicológicos e sociais. Muitos estudos, realizados em diferentes contextos socioculturais, demonstram que em populações de estudantes adolescentes e jovens verifica-se a associação entre não ter religião (ou pertencer a denominações mais liberais), ter pouca crença religiosa, não frequentar igreja e cultos e maior uso de álcool e drogas (Tabelas 1 e 2).



Desta forma, estudos internacionais indicam um importante efeito da afiliação religiosa e diferentes dimensões da religiosidade associados à modulação do uso de álcool e drogas em adolescentes.

Religião e uso de álcool e drogas por estudantes no Brasil

Em nosso país, o mais amplo estudo que inclui o tema religião e uso de drogas em adolescentes foi realizado em 1992. Este estudo incluiu 16.117 estudantes de primeiro e segundo graus, de quinze cidades brasileiras, mostrando uma correlação negativa fraca, mas constante, entre consumo de álcool e drogas e freqüência de atividades religiosas. Os jovens praticantes de atividades religiosas tendiam, dessa forma, a um menor uso de álcool e drogas.

Borini e colaboradores, em 1994, estudando 322 estudantes de medicina em Marília, SP, verificou que a prevalência do uso de álcool (incluindo bebedores discretos, moderados e excessivos) era significativamente menor entre os protestantes (50%) em relação aos católicos (75,2%), espíritas (75,0%) e ateus (94,5%). Ele também não detectou, nessa amostra, bebedores excessivos entre os protestantes e os espíritas. Com uma população bem maior, o estudo de Queiroz incluiu 2.564 estudantes universitários de 21 cursos da USP e utilizou uma análise de regressão logística. Este estudo revelou uma associação entre maior uso de drogas e não ter uma religião. 

Mais recentemente, Kerr-Corrêa e colaboradores, em 2002, realizaram um levantamento com 11.876 estudantes (11.382 universitários e 624 secundários) do Estado de São Paulo. Através de análise de regressão logística, os autores identificaram que, entre os estudantes secundaristas, o uso excessivo de álcool relacionou-se a não praticar religião. Entre os estudantes universitários, o uso de maconha associou-se a não ter religião e o uso de solventes a não praticar religião. Analisando os resultados como um todo, os autores concluem que o uso de álcool e drogas é modulado por normas, valores e práticas grupais, tanto do grupo familiar como de grupos extra-familiares (amigos, religião, etc).

O objetivo deste trabalho foi verificar como variáveis de religiosidade, tais como ter ou não ter religião, filiação religiosa, freqüência a cultos, considerar-se uma pessoa muito ou pouco religiosa e educação religiosa na infância podem influenciar o uso freqüente e/ou pesado de álcool e drogas entre adolescentes.

Método

Trata-se de um estudo transversal com uma técnica de amostragem do tipo intencional, de conveniência. No ano de 1998, foram avaliados 2.287 estudantes de 1º e 2º graus de escolas com diferentes contextos socioeconômicos e culturais: duas escolas públicas periféricas, duas escolas públicas centrais e três escolas particulares centrais da cidade de Campinas.

Foi utilizado um questionário anônimo de autopreenchimento baseado no questionário do CEBRID. Neste trabalho, analisou-se e comentou-se apenas sobre as variáveis referentes à religiosidade. Outras dimensões e variáveis significativas encontradas foram discutidas em um outro trabalho.

Variáveis pesquisadas

O questionário empregado colheu dados das seguintes variáveis: gênero; idade; nível socioeconômico; tipo de escola; grau e período em que estudava; trabalho; tipo de lazer; apoio e compreensão de amigos(as) e/ou namorado(a); por quem foi criado nos últimos dois anos; situação dos pais; com quem mora; apoio e compreensão familiar; defasagem escolar; GHQ-12 e uso de drogas lícitas e ilícitas. 

O GHQ-12 (General Health Questionaire) é um instrumento de rastreamento (screening) de transtornos mentais que contém 12 questões com os sintomas psiquiátricos mais freqüentes na comunidade. Foi validado para a população brasileira por Mari e Williams, em 1985. Em relação à religiosidade, nesta pesquisa foram colhidos os seguintes dados: ter ou não religião (ter ou ser adepto de qualquer uma religião ou denominação religiosa); filiação religiosa; freqüência de ida à igreja por mês; considerar-se uma pessoa religiosa (muito, moderadamente, pouco ou não religioso); e educação religiosa na infância (muito religiosa, moderadamente, pouco ou não religiosa).

Drogas estudadas

As drogas estudadas foram: álcool, tabaco, medicamentos, maconha, solventes, cocaína e ecstasy. De acordo com a OMS, considerou-se uso no mês, o uso de drogas nos 30 dias que antecederam a pesquisa; uso freqüente, o uso de 6 a 19 vezes nos 30 dias que antecederam a pesquisa; e uso pesado, o uso em 20 dias ou mais nos 30 dias que antecederam a pesquisa.

Para substâncias que são largamente utilizadas, como tabaco, álcool, maconha e solventes, foram realizadas análises multivariadas individuais para cada uma dessas drogas, considerando-se o uso pesado. Para cocaína, "medicamentos para dar barato" e ecstasy, pela freqüência do uso ter sido bem menor em nossa amostra, optou-se por trabalhar com "uso no mês".

Por ser muito freqüente o uso de várias drogas concomitantemente (poliuso) e visando comparar estudantes que não usaram nenhuma droga no mês e estudantes que fizeram uso pesado de pelo menos alguma droga, criou-se uma variável denominada DROGA. Esta variável assume o valor 0 se o estudante não fez uso no mês de nenhuma das drogas citadas; e 1, se fez uso de pelo menos uma das drogas estudadas em 20 dias ou mais do mês anterior.

Análise estatística

As variáveis relacionadas à religiosidade foram: ter ou não ter uma religião, filiação religiosa; tempo em que está na religião; freqüência de ida à igreja por mês; considerar-se uma pessoa religiosa e educação religiosa na infância. Para identificar como as variáveis de religiosidade influenciam o uso pesado de qualquer droga (álcool, tabaco, maconha, solventes, cocaína, ecstasy e "medicamentos para dar barato"), foi utilizado um procedimento de análise multivariada (que considera as variáveis de forma conjunta) – a Análise de Regressão Logística para Resposta Dicotômica. 

O método de variáveis explicativas utilizado na regressão logística foi stepwise. Os testes estatísticos utilizados foram: qui-quadrado, para as diferenças de freqüência; ANOVA, para comparação de mais de duas de médias; e t-Student para duas médias.

Aspectos éticos

Este trabalho foi aprovado na sua íntegra pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP e foi obtido o consentimento livre e informado das Delegacias de Ensino, dos Diretores e Associação de Pais das escolas envolvidas. Foi explicitamente dito a todos os estudantes, antes da aplicação do questionário, que eles tinham pleno direito em não participar da pesquisa e que isso não implicaria em qualquer forma de desaprovação ou repreensão por tal recusa. A aplicação foi coletiva, em sala de aula, sem a presença do professor. A garantia e a certeza do anonimato foram enfatizadas no início das entrevistas.

Resultados

1. Aspectos gerais da amostra

A amostra inicial foi de 2.375 alunos. Desses, foram excluídos 86 alunos, que tinham idade superior a 26 anos (apesar de serem alunos de 1º ou 2º grau). Dois questionários foram desprezados por preenchimento incompleto ou não compreensão das perguntas. Não houve recusas em responder os questionários. Não foi possível aferir o número exato de alunos faltosos mas, pelos relatórios de aplicação, estima-se que sejam pouco numerosos, pois a ampla maioria das classes estava cheia no momento da entrevista. Foram, portanto, incluídos para análise na pesquisa 2.287 estudantes. 

Desses, 1.188 (52%) eram do sexo masculino e 1.096 (48%) do sexo feminino. A média de idade foi de 15,8 (Desvio Padrão 2,7; variação 11-26); 781 (34,1%) estudavam em escolas públicas centrais, 763 (33,6%) em escolas públicas periféricas e 738 (32,3%) em escolas particulares centrais; 1.159 (50,8%) cursavam o 1º grau e 1.122 (49,2%) cursavam o 2º grau.

Os resultados da análise bivariada (análise que cruza duas variáveis) são apresentados nas Tabelas 3 e 4. Na Tabela 5 são apresentados os resultados da análise multivariada.




Análise multivariada

No modelo de análise multivariada empregado não se pôde identificar relação estatisticamente significativa entre o uso pesado específico de tabaco, álcool, solventes e maconha e as variáveis de religiosidade. Para cocaína, "medicamentos" e ecstasy (com as quais trabalhou-se com uso no mês), os valores significativos encontrados são apresentados na Tabela 5. Nesta tabela também se encontram os resultados significativos para a variável criada a posteriori, denominada "DROGA".

Discussão

Os dados do presente trabalho reforçam claramente a evidência demonstrada pela literatura internacional e nacional, a saber: várias dimensões da religiosidade são possivelmente fatores relevantes na modulação do uso e abuso de álcool e drogas por diversos grupos populacionais, particularmente adolescentes e jovens.

Limitações do estudo

Deve-se apontar aqui algumas limitações metodológicas deste estudo. Por tratar-se de amostra de conveniência, foram escolhidas intencionalmente escolas públicas e particulares, de bairros centrais e periféricos, para efeito de contraste da realidade socioeconômica e cultural dos estudantes. Assim, não contamos com uma amostra representativa de todos os estudantes da cidade de Campinas. Portanto, possíveis generalizações dos dados podem ser feitas apenas com muita cautela.

De forma relativamente surpreendente, não obtivemos recusas de alunos em responder aos questionários nas salas de aula. Isto talvez se deva a um extremo cuidado no esclarecimento dos alunos sobre os objetivos da pesquisa e na garantia enfática do anonimato. Por outro lado, não foi possível controlar o viés produzido por alunos faltosos, no dia da entrevista. É possível que esses alunos sejam, de fato, os mais gravemente envolvidos com o uso de álcool e drogas. Entretanto, esta é uma limitação de qualquer pesquisa realizada em escolas. De qualquer forma, os entrevistadores observaram que nos dias de aplicação as classes estavam, de modo geral, cheias, indicando que o número de faltosos foi possivelmente pequeno.

Finalmente, uma crítica pode ser feita por termos incluído o tabaco junto com o álcool e as outras drogas, no construto "DROGA" (uso pesado de qualquer droga no último mês). O uso de tabaco, de modo geral, tende a ser diário, configurando quase sempre um "uso pesado". É certo que tal uso não implica, necessariamente, alterações comportamentais e psicossociais sérias (como é o caso para uso pesado de álcool, maconha ou cocaína). Entretanto, optamos por manter o tabaco no conjunto de drogas de uso pesado, pois tal uso implica em sérios riscos à saúde física do adolescente.

Nunca é demais relembrar que, por se tratar de um estudo observacional e transversal, não se identificou aqui relações causais (como, por exemplo, maior religiosidade produzindo menor uso de drogas), mas apenas associações descritivas, cujos vetores de causalidade podem estar em pontos não identificados pelos pesquisadores.

Religiosidade na amostra estudada

Em nossa amostra, ao se analisar a relação da religiosidade com o perfil sociodemográfico dos estudantes e tipo de escola, verificou-se que as garotas afirmam mais que os rapazes ter religião e ter tido uma educação mais religiosa, assim como se consideram significativamente mais religiosas do que eles. Uma maior religiosidade no gênero feminino é um dado muito recorrente em diversas culturas (inclusive as ocidentais), relativamente bem documentado na literatura sociológica. 

Não se verificou diferenças em relação às variáveis religiosas e idade. Os alunos de escolas públicas periféricas tendem a ser mais evangélicos históricos ou pentecostais e menos freqüentemente espíritas. Assim como se consideram mais religiosos, têm uma maior freqüência aos cultos e tiveram com mais freqüência uma educação muito religiosa na infância. Em suma, os estudantes mais intensamente religiosos são garotas e alunos de escolas públicas da periferia.

Variáveis de religiosidade

De modo geral, muitas são as variáveis relacionadas à religião estudadas em pesquisas sobre o uso de álcool e drogas em adolescentes. A maior parte dos estudos têm investigado predominantemente a afiliação religiosa e a freqüência a cultos. Entretanto, vários pesquisadores também incluíram variáveis como: importância atribuída à religião na vida, envolvimento com a religião (religious commitment), medidas de crença religiosa (crença em Deus, intensidade da fé, etc), práticas religiosas pessoais (orações solitárias, leituras religiosas, etc), participação em atividades da igreja além dos cultos, tempo gasto com atividades religiosas e crenças e valores religiosos ortodoxos ou fundamentalistas. 

Desta forma, é difícil comparar os estudos e mesmo identificar qual dimensão da experiência religiosa é mais significativa para a modulação do uso de álcool e drogas. Optamos, neste estudo, por atermo-nos à apenas quatro dimensões: afiliação religiosa, freqüência a cultos e uma medida de auto-avaliação geral quanto à religiosidade, implicada no considerar-se (em vários graus) uma pessoa religiosa. Além disso, incluímos a educação religiosa na infância, posto que esta indicaria a influência da religiosidade familiar sobre o adolescente.

Das denominações religiosas presentes em nosso meio, os protestantes históricos e pentecostais apresentaram, relativamente, uma maior freqüência de não usuários e os católicos e espíritas uma maior freqüência (também relativa) de usuários pesados. Isto é compatível com a literatura na qual verifica-se que as denominações mais conservadoras tendem a apresentar menos usuários de álcool e drogas entre os seus membros.

De modo geral, verificou-se, na análise bivariada, que todas as variáveis religiosas, com exceção da "freqüência religiosa", estiveram significativamente associadas ao uso pesado de drogas. Tal associação ocorreu sempre no sentido de quanto mais religioso o subgrupo de estudantes menor a freqüência de uso pesado de droga.

A ausência de relação entre freqüência religiosa e uso de drogas em nossa amostra chama a atenção, posto que a maior parte dos estudos tem identificado que quanto mais o adolescente frequenta cultos ou missas, menos usa álcool e drogas (revisão em Francis). Entretanto, alguns estudos não puderam, como nós, encontrar tal relação.

Das quatro variáveis estudadas, a mais recorrente na análise multivariada, associada a um possível efeito inibidor do uso de álcool e drogas, foi "ter tido uma educação religiosa (ou muito religiosa) na infância".

Também deve-se ressaltar que, tanto "não ter tido uma educação religiosa na infância", como considerar-se uma pessoa "não religiosa", foram as características que se relacionaram à maior pontuação no GHQ-12, que indica presença de sintomas psicopatológicos. Embora a diferença absoluta em pontuação seja pequena, é possível supor que os adolescentes com menos educação religiosa e menos religiosidade pessoal atual tendam também a ser aqueles que se sentem psicologicamente pior.

No presente estudo, na análise multivariada, chamou a atenção que a variável "ter tido uma educação religiosa na infância" foi a que mais recorrentemente relacionou-se a um menor uso no mês ou uso pesado das diferentes drogas. Tal achado é intrigante, posto que entre os dois fenômenos (uso de drogas na adolescência e educação religiosa na infância) há uma considerável distância temporal.

Na realidade, são muitas as possíveis implicações do afirmar "ter tido uma educação religiosa na infância". De início, constata-se que a definição do que exatamente é "educação religiosa" é complexa e relativamente vaga. Boys,35 revisando o tema "educação religiosa", afirma que os vários conceitos e noções implicados denotam uma confusão conceptual e empírica considerável.

No caso do nosso estudo, ter tido uma educação religiosa na infância pode implicar desde ter tido uma educação com mais regras e normas morais e comportamentais claras, ter tido um ambiente sociofamiliar mais estruturado, assim como ter internalizado valores que dão significado à vida. Os dados disponíveis, entretanto, não permitem tais minúcias, devendo-nos obrigar a uma posição de cautela interpretativa. Jessor e Jessor não encontraram relação entre grau de fundamentalismo religioso dos pais e uso de álcool pelos filhos. 

Por outro lado, uma importante pesquisa, recentemente publicada, investigou dados relativos à educação, religiosidade e atitudes morais em 16.604 sujeitos, em 15 países. Os autores puderam identificar que as atitudes morais de um indivíduo criado por pais religiosos são claramente mais "conservadoras" do que as daqueles criados por pais não religiosos. Verificaram também que os efeitos da socialização na infância com pais religiosos mantêm-se durante o período adulto. 

Finalmente, verificaram que a influência da religiosidade sobre atitudes morais é mais intensa nos países menos secularizados. Segundo os autores, nos países nos quais a religiosidade era, de forma geral, mais importante na vida social, a religiosidade individual e dos pais tendeu a nortear mais marcadamente as atitudes morais e padrões comportamentais dos indivíduos.

De forma geral, os dados do presente estudo (maior influência da "educação religiosa", "considerar-se mais religioso" e menor influência da "freqüência aos cultos") indicam que dimensões da religiosidade relacionadas à internalização de normas, valores e atitudes morais e religiosas foram mais importantes do que uma possível prática social religiosa, como ir com freqüência a cultos e missas.

Tal achado é corroborado por dois estudos que apontam na mesma direção. Patocvk-Peckham e cols. verificaram, em 263 estudantes universitários, que a religiosidade intrínseca (valores e normas religiosas, assim como normas éticas pessoais introjetadas, utilizadas no dia-a-dia) associou-se a um menor uso de álcool e menos problemas relacionados ao álcool, enquanto que a chamada religiosidade extrínseca (relacionada à busca utilitarista na igreja de segurança, sociabilidade, status e auto-justificação) não se mostrou relacionada ao uso de álcool.

No mesmo sentido, Laflin e cols., ao estudar variáveis como o uso de drogas, atitudes em relação às drogas, normas subjetivas e auto-estima, em 2.074 estudantes de segundo grau e universitários nos EUA, identificaram que as normas e atitudes subjetivas em relação ao uso de drogas foram mais importantes do que a auto-estima atual do estudante para a determinação do uso de álcool e drogas. 

Esses autores, apoiados nas teorias de "ação planejada" e da "ação racionalizada", sustentam que as normas subjetivas e atitudes internalizadas em relação ao uso de drogas são os fatores mais fortemente associados ao uso ou não uso de drogas em adolescentes. Normas subjetivas, que orientam atitudes, são "dimensões" muito mais 'introjetadas" da religiosidade do que as práticas sociais externas de freqüência a cultos.

Também apoiando esta interpretação, os dados da presente pesquisa, assim como outros estudos, revelam que utilizam significativamente menos álcool e drogas os grupos de estudantes protestantes pertencentes a denominações mais conservadoras. Tais grupos (nos EUA, protestantes conservadores e, no Brasil, protestantes históricos e pentecostais) condenam o uso de álcool e drogas de forma mais clara e explícita do que os grupos mais liberais (nos EUA, protestantes liberais e católicos; e no Brasil, católicos e espíritas), entre os quais a condenação não é tão enfatizada. 

Bock e colaboradores, ao analisarem os dados do senso norte-americano de 1972 a 1980 para pessoas não institucionalizadas com mais de 18 anos, verificaram que o impacto inibidor da religião sobre o uso e abuso de álcool é progressivamente maior naqueles grupos religiosos que explicitamente condenam tal uso. Nesta linha, dois trabalhos recentes identificaram, em amostras extensas e com métodos epidemiológicos rigorosos, a associação entre pertencer a grupos religiosos conservadores, assim como ter maior devoção religiosa pessoal, e utilizar menos e ter menos dependência ao álcool e outras drogas.

Desta forma, nossos resultados, assim como os estudos mencionados, apontam para uma possível maior influência de uma religiosidade internalizada, com normas, valores e proibições ancoradas na subjetividade do adolescente, dimensão esta possivelmente mais importante do que o simples frequentar uma determinada denominação. Estudos futuros deverão investigar mais profundamente essa possibilidade.

Em conclusão, gostaríamos de lembrar que, ao se aderir a uma denominação religiosa e envolver-se com padrões de religiosidade, adere-se a um conjunto de valores, símbolos, comportamentos e práticas sociais, enfim, adere-se a um amplo e complexo ethos religioso que inclui, entre outras coisas, a aceitação ou recusa ao uso de álcool e drogas.

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